Pasado Abierto. Revista del CEHis. Nº2. Mar del Plata. Julio-Diciembre 2015.
ISSN Nº2451-6961.
http://fh.mdp.edu.ar/revistas/index.php/pasadoabierto
A Democracia em Construção: Eleições no Brasil Republicano
Diorge Alceno Konrad
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
gdkonrad@uol.com.br
Recibido:09/10/2015
Aceptado: 28/11/2015
Resumen
Este artigo pretende realizar uma síntese dos diferentes processos eleitorais, defendendo a hipótese de que as eleições democráticas no Brasil têm sido marcadas por embates políticos que originaram avanços e retrocessos na democracia burguesa do País. Assim, este processo, a que chamaremos aqui de “democracia em construção”, coloca em plano mais amplo a intensa luta de classes que se expressa no plano eleitoral entre dois grandes projetos em disputa para o País: um, dos grupos políticos que expressam as classes dominantes brasileiras como aliadas táticas de interesses externos do grande capital financeiro; outro, dos setores nacionais e dos trabalhadores, com todas as suas contradições, que defendem um projeto autônomo de desenvolvimento econômico e social.
Palabras claves: eleições; democracia; Brasil Republicano
La Democracia en Construcción: Elecciones en el Brasil Republicano
Resumen
Este artículo tiene la intención de llevar a cabo una síntesis de los diferentes procesos electorales, abogando por la hipótesis de que las elecciones democráticas en el Brasil republicano han estado marcadas por los enfrentamientos políticos que dieron origen a los avances y retrocesos en la democracia burguesa en el país. De este modo, este proceso, que llamaremos aquí "democracia en construcción", pone en plan más amplio la lucha de clases intensa que se expresa en el campo electoral entre dos grandes proyectos en lucha: uno, el de los grupos políticos que expresan las clases dominantes brasileñas como aliadas tácticas de intereses externas del gran capital financiero; otro, el de los sectores nacionales y los trabajadores, con todas sus contradicciones, que defienden un proyecto autónomo de desarrollo económico y social.
Palabras clave: elecciones; democracia; Brasil Republicano
Democracy in Construction: Elections in Brazil Republican
Abstract
This article intends to carry out a synthesis of the various electoral processes, advocating the hypothesis that democratic elections in the Republican Brazil have been marked by political clashes that led to progress and setbacks in bourgeois democracy the country. Thus, this process, which we call here "reluctant democracy" plan put into wider intense class struggle that is expressed in the electoral field between two major projects in struggle: one, the political groups expressing classes Brazilian and allied tactical dominant external interests of big finance capital; another, the national and sector workers, with all its contradictions, advocating an autonomous project of economic and social development.
Keywords: elections; democracy; Republican Brazil.
A Democracia em Construção: Eleições no Brasil Republicano
Introdução
Diferentemente da maioria dos países latino-americanos, a República Brasileira foi uma conquista mais demorada ao longo no século XIX. Mantendo a herança escravista da Colônia, a Independência nos legou uma Monarquia Parlamentar, marcada por um liberalismo conservador com resquícios até a atualidade
A própria transição do modo de produção escravista para o capitalismo foi carregada de conservadorismo, com os latifundiários prolongando ao máximo a escravidão, impedindo que a luta de classes dos escravos se tornasse alternativa de poder político e garantindo uma República Liberal e Conservadora dominada pelos fazendeiros e outras frações da nova burguesia agrária brasileira, mesmo que com a Abolição da Escravidão (1888), a República (1889) e a Constituição Republicana (1891), se garantisse as bases do Estado Burguês no Brasil (Saes, 1985).
Este artigo de síntese, a partir de fontes secundárias (mesmo que baseadas em algumas pesquisas de fontes primárias nos artigos originais do autor), tem por objetivo apresentar um panorama da disputa eleitoral no Brasil Republicano, através de um único processo, ouse já, um longo caminho, mesmo com a ciência de que as fases políticas do Brasil sejam distintas.
Eleições no Brasil Republicano: o Longo Caminho
Com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, ocorreu a ascensão de partidos republicanos regionalizados, cada qual defendendo os interesses dos grandes proprietários de seus estados. Durante este período, em nível nacional, ganharam um maior destaque os partidos republicanos de São Paulo e de Minas Gerais que se alternaram na presidência do País, consolidando a República dos fazendeiros, especialmente da oligarquia cafeicultora, ocorrendo a reestruturação das forças políticas no controle do poder central (Cf. Konrad y Lima, 2013: 55-61).
Proclamada a República, como mostra Helga Piccolo, “era necessário institucionalizá-la”. Em 23 de julho de 1890, foi criado o Regulamento Eleitoral, o qual organizará as eleições para a Assembleia Constituinte Nacional (Piccolo, 1996: 16).
Alguns dos principais elementos da nova Constituição, a de 1891, também precisam ser destacados. Entre eles, a inspiração na organização política norteamericana e a abolição das principais instituições monárquicas, entre elas o Poder Moderador, o Conselho de Estado e a vitaliciedade do Senado. Além disso, passou a ser introduzido o sistema de governo presidencialista, no qual “o presidente da República, chefe do Poder Executivo, passou a ser eleito pelo voto direto para um mandato de quatro anos, sem direito à reeleição. Tinham direito a voto todos os homens alfabetizados maiores de 21 anos”. Somado a isso, o Poder Legislativo era exercido pelo Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, enquanto o poder dos estados (antigas províncias) foi significativamente ampliado com a introdução do princípio federalista. Com a nova legislação, os estados passaram a organizar-se com leis próprias, desde que respeitando os princípios estabelecidos pela Constituição Federal. Na Primeira República, seus governantes, denominados presidentes estaduais, passaram a ser eleitos também pelo voto direto (Constituição do Brasil de 1891).
Um dos fenômenos políticos mais característicos da Primeira República Brasileira foi o “coronelismo”, expressão de uma classe proprietária agrária e aburguesada que estabelecia um sistema eleitoral elitista e uma força política e militar, cuja grande marca era o “voto a cabresto”, as constantes fraudes eleitorais e o aprofundamento da ideologia do favor.
No Rio Grande do Sul, como sucessor de Borges de Medeiros na presidência do Estado, entrou em cena Getúlio Vargas, ex-Ministro da Fazenda do Governo Federal de Washington Luís (1926-1930). Eleito pela unidade da Frente Única Gaúcha (FUG), coligando governo e oposição conservadora, o PRR com o agora Partido Libertador (PL), base política da Aliança Liberal (AL) que colocaria o próprio Vargas como candidato à Presidência nas eleições nacionais de 1930.
Com o Movimento de 1930 vitorioso (Konrad, 2013a: 93-110) e a chegada ao Governo Federal da oposição oligárquica, liderada por Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba, ocorrida em 24 de outubro, começou o processo mais acentuado de um modelo econômico de desenvolvimento nacional e autônomo (Konrad, 1987: 38). A crise econômica de 1929 afetara a economia do País como nunca, fazendo com que os preços baixassem de forma brutal, especialmente o café, com o aumento dos estoques, o principal produto de exportação, ao mesmo tempo em que ocorreu uma retração do mercado, gerando contínuos impasses para a agricultura, a pecuária e o comércio, aumentando as dívidas (Konrad y Ramos, 1988: 31).
Em termos políticos, 1930 tinha dívidas profundas com as reivindicações de moralização das eleições, uma das principais demandas do Movimento Tenentista, o qual marcara a década de 1920, somando-se aos pleitos de reforma da Constituição de 1889 e da legislação eleitoral vigente e herdada da Primeira República.
Uma das primeiras medidas do “Governo Provisório” foi a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC). Getúlio Vargas e outros líderes do novo governo, como Lindolpho Collor, em constantes discursos e manifestações públicas, reiteravam a máxima de que no Brasil “a questão social havia deixado de ser caso de polícia”. Cumpria-se, assim, parte importante da plataforma eleitoral da Aliança Liberal, que dentre seus pilares, apresentara a diretriz da harmonia social para a solução governamental em relação ao problema dos conflitos entre capital e trabalho, tão comuns na época da Primeira República (Konrad, 2004: 32).
No pós-outubro de 1930, a manutenção da ordem continuou tendo um braço importante para a sua realização. Não era qualquer polícia, mas uma organização que já vinha sendo desenvolvida durante muitos anos: a polícia política, com funções preventivas e repressivas, cuja finalidade era impedir as reações políticas contra a “ordem e a segurança pública” (Konrad, 2004: 140).
A chamada “Revolução de 1930” evidentemente aprofundou a “modernidade” burguesa para o Brasil, com a consolidação do trabalho livre, urbano e mecanizado, uma das bases de sustentação econômica. Porém, a “modernização”, que implica também nos pilares políticos clássicos que qualquer burguesia, baseados na igualdade de direitos e na democracia participativa, ainda encontrou muita reticência para criar raízes nesse período (Konrad, 2004: 200-201), tanto que, em 11 de novembro, Getúlio Vargas decretou a dissolução do Congresso Nacional, das câmaras estaduais e dos conselhos municipais de todo o País.
Logo no início de 1932, o Partido Democrático (PD) de São Paulo, rompeu com o “Governo Provisório”, passando a utilizar a tática central da reivindicação da reconstitucionalização do País. Logo depois, em 16 de fevereiro, as classes dominantes paulistas se reorganizam politicamente, reunindo o PD e o PRP e formando a Frente Única Paulista (FUP), em oposição ao Governo Federal (Konrad, 2004: 208).
Pressionado pela oposição liberal-conservadora, em 1932, Getúlio assinou o Código Eleitoral e criou a Justiça Eleitoral, regulando as eleições federais, estaduais e municipais. O Código introduziu o voto secreto e o voto feminino e o sistema de representação proporcional. A legislação eleitoral, pela primeira vez, fez referência aos partidos políticos, ainda aceitando a candidatura avulsa.
Em 9 de julho, iniciou a auto proclamada Revolução Constitucionalista, em São Paulo, derrotada pelas tropas federais três meses depois. Uma das reivindicações da Constitucionalista de 1932 era a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte (ANC), aceita por Vargas e decretada sob nº 22.621 em 1933. A ANC, quando as mulheres votavam pela primeira vez na história brasileira, ainda estabeleceu que, além dos deputados eleitos na forma prescrita pelo Código Eleitoral, outros quarenta seriam eleitos pelos sindicatos legalmente reconhecidos, pelas associações de profissionais liberais e de funcionários públicos. Consolidava-se a representação classista, aos moldes do corporativismo.
Em 28 de maio de 1934, finalmente, a ANC votou pela anistia e pela restituição dos direitos políticos aos implicados no Movimento de 1932. No mesmo dia, a ANC possibilitou a eleição constitucional de Getúlio Vargas. Dois dias depois, a medida era estendida aos interventores estaduais (Konrad, 2004: 288-289).
Quando da promulgação da nova Constituição, diante da ANC, Rio de Janeiro, 15 de julho de 1934, Getúlio Vargas fez um longo discurso criticando a nova Carta e o seu conteúdo liberalizante (Apud Prestes, 1999: 80). Mesmo assim, em 1935, as críticas ao Código Eleitoral de 1932 levaram à promulgação de novo Código, a Lei nº 48.
Em todo o País, entre 1934 e 1935, uma das formas de reação contra a Lei de Segurança Nacional (LSN), que vinha sido discutida no Congresso, foi a ampliação de uma ampla frente de antifascistas. Este processo resultou no lançamento da Aliança Nacional Libertadora (ANL), em 12 de março de 1935 (Sobre a ANL, ver: Konrad, 1994).
A aprovação da LSN, em 29 de março do mesmo ano, um golpe nas liberdades democráticas da Constituição de 1934, coroava os desejos de Vargas e de seus apoiadores para o aumento da coerção e do poder político-policial diante da sociedade. A Insurreição Nacional-Libertadora, em novembro de 1935, apenas explicitou a justificativa que estava oculta, preparada desde a Lei de Segurança (Konrad, 2004: 359).
Em reação ao Levante de 1935, o Governo Vargas reforçou a LSN. Seus desdobramentos, entre 1935 e 1936, resultaram na decretação do Estado de Sítio e do Estado de Guerra, bem como a criação do Tribunal de Segurança Nacional (TSN) e da Comissão Nacional de Repressão ao Comunismo (CNRC).
Efetivada a repressão contra os ideais nacional-libertadores, em 1937, abriu-se para o debate eleitoral, quando Getúlio lançou a candidatura do escritor José Américo de Almeida. Contraditoriamente, por outro lado, enquanto o governo preparava o fechamento do regime, a campanha presidencial ampliava as manifestações públicas, especialmente pelas forças liberais e conservadoras que apostavam na eleição de Armando de Salles Oliveira, então Governador de São Paulo, enquanto que os integralistas lançaram a candidatura de Plínio Salgado.
O impedimento das eleições e o fim dos governos constitucionais estavam sendo construídos. Mas se precisava de um motivo aglutinador para ganhar o apoio da maioria da população. Este motivo veio através do Ministério da Guerra e de um documento atribuído ao Komintern, que supostamente “dava instruções” para “uma nova revolução comunista no Brasil”. O Governo Vargas, que intencionava um novo decreto de Estado de Guerra, era o maior interessado na “descoberta” de um novo plano de assalto ao poder. A justificativa para tal foi o chamado “Plano Cohen”.
Mas de nada adiantaram as denúncias de que o “Plano Cohen” havia sido inventado para justificar o fechamento do regime. Na Câmara dos Deputados, no dia 1º de outubro, se votou o novo pedido de Estado de Guerra solicitado por Vargas. De fato, faltava pouco para a ditadura.
Assim, com o apoio a uma das maiores farsas do período republicano, os liberais colaboraram para colocar a guilhotina em suas próprias cabeças e na candidatura de Armando de Salles Oliveira. Por outro lado, ficava evidente que o “Plano Cohen”, a pretexto de combate ao comunismo, visou impedir a realização de eleições presidenciais (e uma possível vitória do candidato liberal) e garantir a permanência do grupo de apoio a Getúlio Vargas no governo (Konrad, 2004: 537-539).
Em 10 de novembro de 1937, o ministro da Justiça Francisco Campos divulgou telegramas a todos os governos estaduais. Neles, se anunciava que, com o apoio das Forças Armadas, acabava-se de promulgar a nova Constituição, dissolvendo a Câmara e o Senado e extinguindo a Justiça Eleitoral, suspendendo as eleições livres, como para o Governo Federal, previstas para maio de 1938, e estabelecendo eleição indireta para Presidente da República, com mandato de seis anos. Iniciava-se o Estado Novo que duraria até 1945 e que deixaria o País sem Poder Legislativo por longos nove anos (Konrad, 2004: 547-548).
O Estado Novo instalou-se no Brasil, através de uma Constituição outorgada por um golpe de Estado que manteve Getúlio Vargas no poder, determinando a abolição das bandeiras, das armas e dos escudos estaduais. Pelo Art. 178, da nova Constituição foram dissolvidos a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as asembleias legislativas dos estados e as câmaras municipais.
Passados nove anos de ditadura, desencadearam-se as vitoriosas campanhas pela anistia aos presos políticos, juntamente com a criação, em 30 de abril de 1945, ainda na vigência do Estado Novo, do Movimento Unificador dos Trabalhadores (MUT), liderado pelo Partido Comunista do Brasil (PCB), o qual apresentava, entre outros pontos: a liberdade sindical; a efetiva sindicalização dos trabalhadores do campo; a plena manifestação de opinião nas assembleias sindicais; a eleição de direções sindicais unitárias; a extinção do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e do TSN: a ampla liberdade de opinião e organização política e; um Código Eleitoral democrático. Como afirmou a historiadora Glaucia Vieira Ramos Konrad, propostas que interessavam a classe e propostas que atingiam o conjunto da sociedade (2006: 12).
Ainda durante o Estado Novo, aproveitando a participação no Brasil na II Guerra Mundial ao lado dos aliados, aumentaram as pressões para o término da Ditadura comandada por Getúlio Vargas. Mesmo com as conquistas de direitos para os trabalhadores, aos poucos, durante a fase final do Estado Novo, ainda marcado pela repressão e pela propaganda ideológica, foi se ampliando a oposição, tanto à esquerda, pela rearticulação ainda clandestina do PCB, especialmente após a Conferência da Mantiqueira, ocorrida em 1943, como à direita, no rearranjo dos setores liberais e conservadores.
Sobretudo, a partir de 1943, com a formação da “União Nacional contra o Fascismo” e a luta do Brasil nos campos da Itália, se ampliou a articulação política das forças oposicionistas a Vargas e a luta pela redemocratização do País, especialmente em defesa da libertação dos presos políticos e pela anistia. Em 18 de abril de 1945, Vargas decretou a anistia geral para os condenados por crimes políticos praticados a partir de16 de julho de 1934, resultando na libertação de comunistas e aliancistas, presos desde 1935, bem como de integralistas, presos desde 1938. O ato também possibilitou a volta do exílio de liberais conservadores, sobretudo da Europa e de países da América Latina, entre outros.
A pressão da oposição de trabalhadores, intelectuais, estudantes, religiosos e empresários foi resultando na adaptação da Ditadura à nova situação política, com a conquista da anistia, a libertação dos presos políticos, a volta dos partidos políticos e o retorno das eleições (Passagens abaixo se inspiram em: Konrad, 2013b: 126-143). Getúlio anunciou eleições gerais, mesmo assim a oposição conservadora e a cúpula militar, tendo Góes Monteiro à frente, se articularam e deram o golpe de 29 de outubro de 1945, derrubando Getúlio e passando o governo ao presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, à época também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O Ato Adicional de 28 de fevereiro de 1945, ou Lei Constitucional n. 9/1945, assinada por Getúlio Vargas, alterou vários artigos da Constituição de 1937 e determinou que, no prazo de noventa dias, seria baixado um decreto fixando a data das eleições gerais param presidência e para os governos estaduais e municipais no Brasil, assim como para o parlamento nacional, as assembleias estaduais e as câmaras de vereadores. Junto a isso, foi promulgado o Decreto-Lei nº 7.586/45, conhecido como Lei Agamenon (em homenagem ao Ministro da Justiça, Agamenon Magalhães, responsável por sua elaboração), restabeleceu a Justiça Eleitoral, regulando em todo o País o alistamento eleitoral e as eleições. Por sua vez, o Código Eleitoral de 1945 trouxe a exclusividade dos partidos políticos na apresentação dos candidatos, vigorando, com poucas alterações, até o advento do Código Eleitoral de 1950. Nesse cenário político em que Justiça Eleitoral foi reinstalada definitivamente, o Código restabeleceu a Justiça Eleitoral, regulando em todo o País o alistamento eleitoral e as eleições, dando as diretrizes para a eleição à Assembleia Nacional Constituinte e as eleições diretas para todos os cargos nos três níveis de governo (Eleições no Brasil, 2013: 56).
Neste meio tempo, a volta dos partidos vai se consagrando. Por liderança de Getúlio Vargas, nasceu o Partido Social Democrático (PSD), representando grandes proprietários do campo e os interventores estaduais do Estado Novo, e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), síntese dos movimentos de trabalhadores oriundos dos sindicatos organizados em torno do governo. Este, na verdade, será o resultado das amplas manifestações populares que resultaram na consigna “Queremos Getúlio!”. O “Queremismo”, como bem demonstrou o historiador Jorge Ferreira, está na origem do PTB, quando, a partir de maio de 1945, com receio de perder os direitos trabalhistas conquistados, os trabalhadores passaram a defender a permanência de Vargas na presidência da República e o adiamento das eleições presidenciais, reforçando o movimento pela Constituinte, mas com Getúlio a frente do governo (Ferreira y Delgado, 2003).
Com o Golpe de outubro, o intento de manter Vargas na Presidência foi derrotado, mesmo assim Getúlio passou a apoiar o ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, como seu candidato, representando o PSD e tendo o apoio do PTB.
Paralelamente a isto, em 7 de abril de 1945, os liberais conservadores trataram de se organizar partidariamente, criando a União Democrática Nacional (UDN), em suas origens com orientação política de oposição às políticas e ao próprio Vargas, em defesa do liberalismo econômico e da abertura ao capital estrangeiro, de franca oposição ao trabalhismo e ao comunismo, tendo sua base social nas classes médias urbanas e em alguns setores da elites políticas. Desta frente de oposição conservadora, nascerá a candidatura às eleições de 1945 do brigadeiro Eduardo Gomes.
A vitória aliada na II Guerra, tendo a frente a União Soviética, os Estados Unidos e a Inglaterra, também foi decisiva para a redemocratização brasileira no que se refere ao pluripartidarismo e a legalidade comunista. Com isso, o PCB conquistou a legalidade, depois de anos de clandestinidade, inclusive lançando candidatura à presidência da República, através do gaúcho Yedo Fiuza, engenheiro e ex-prefeito de Petrópolis, no Rio de Janeiro, durante a década de 1930, o qual contaria, em 1945, com votos das camadas médias, populares e trabalhadoras das grandes cidades brasileiras. Por outro lado, o Partido Agrário Nacional (PAN), lançou a candidatura do inexpressivo e político Mário Rolim Teles, raramente citado na historiografia brasileira.
Em 2 de dezembro de 1945, realizaram-se as eleições para a Presidência e para a formação da Assembleia Nacional Constituinte, elegendo-se Presidente da República o General Gaspar Dutra, com 55,39% do total dos votos, o que garantiria o mandato até 1951. O brigadeiro Eduardo Gomes, apoiado por uma ampla frente de oposição contra Vargas, tendo na linha de frente grandes meios de comunicação, obteve 34,74% dos votos. Fiuza conquistou 569.818 mil votos no pleito e atingiu 9,71% do eleitorado, enquanto Mário Rolim Teles obteve 10.001 votos, com 0,17% dos votos. O PSD teve maioria para a Assembléia Nacional Constituinte, com 61,9% dos votos para o Senado e 52,7% para a Câmara dos Deputados, conquistando a maioria nas duas Casas do Congresso Nacional. A UDN, o PTB e o PCB receberam respectivamente 23,8%, 4,7% e 2,3% dos votos para o Senado e 26,9%, 7,6% e 4,8% dos votos para a Câmara dos Deputados, sendo que Vargas dói eleito senador pelo Rio Grande do Sul e por São Paulo e deputado constituinte pelo Rio Grande do Sul e por São Paulo, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Bahia, situação possível devido à legislação eleitoral da época (logo após, a Constituição de 1946, além de consagrar a Justiça Eleitoral entre os órgãos do Poder Judiciário, proibiria a inscrição de um mesmo candidato por mais de um estado), recebeu cerca de 1.150.000 votos (Freire, s/data).
Dutra tomou posse na presidência da República, enquanto em 2 de fevereiro de 1946 foi instalada a Constituinte, a primeira na Formação Histórica do Brasil a garantir uma representação de nove partidos, contando com uma bancada comunista, o que marcou a heterogeneidade político-ideológica da sua representação. A bancada do PCB na Constituinte Federal foi composta por Luiz Carlos Prestes, senador, e pelos deputados Carlos Marighella, Maurício Grabois, João Amazonas, Jorge Amado, Gregório Lourenço Bezerra, Abílio Fernandes (eleito pelo Rio Grande do Sul), Carlos Francisco Gomes, Agostinho Dias de Oliveira, Alcêdo de Moraes Coutinho, Claudino José da Silva, Henrique Cordeiro Oest, Gervásio Gomes de Azevedo, José Maria Crispim e Oswaldo Pacheco da Silva (Cf. Aita, Axt y Araújo, 1996: 133).
Finalmente, em 18 de setembro de 1946, a Constituição foi promulgada, garantindo o Estado Democrático de Direito Liberal, as novas diretrizes jurídicopolíticas para o Brasil e as liberdades individuais e políticas do cidadão, consagrando na ocasião, por exemplo: a igualdade de todos perante a lei; a liberdade de manifestação de pensamento, a liberdade de consciência, de crença e de exercício de cultos religiosos; a separação dos três poderes; o restabelecimento do princípio federativo e; a democracia representativa. Passados poucos mais de sete meses da Assembleia Nacional Constituinte e da promulgação da nova carta, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal passaram a funcionar como Poder Legislativo ordinário.
Depois do novo texto constitucional ser aprovado e a Assembléia Nacional Constituinte se transformar em Congresso ordinário, durante o Governo Dutra (Ver: Constituição de 1946), entretanto, como afirma Américo Freire, “a nova Constituição seria interpretada tanto para assegurar direitos como para restringir o pluralismo político, como aconteceu quando da cassação do registro do PCB, em maio de 1947” (Freire, s/data).
Em resposta à cassação, o PCB requereu habeas corpus para o funcionamento das suas sedes, mas o pedido foi negado. Como ato final, ocorreu a “exclusão dos comunistas do sistema político-partidário”, sendo que, em janeiro de 1948, ocorreu a cassação dos mandatos de todos os parlamentares eleitos pelo PCB. Como resultado, “o PCB lançou um manifesto pregando a derrubada de imediata do Governo Dutra, considerado um governo ‘antidemocrático’, de ‘traição nacional’ e ‘a serviço do imperialismo norte- americano’, pois, “além de perseguir os comunistas, o Governo Dutra, totalmente alinhado com os Estados Unidos, em outubro de 1947 rompeu as relações diplomáticas do Brasil com a União Soviética” (Pandolfi, s/data).
Getúlio Vargas voltaria à Presidência da República “nos braços do povo”. Após campanha massiva por todo o País, defendendo um programa nacional com reformas sociais. Assim, o trabalhismo retornou ao comando político da Nação, porém, apesar de “eleito pelo povo”, o governo iniciaria com uma marca mais conservadora. Os reflexos do aprofundamento da chamada “Guerra Fria”, sobretudo após o reacionário Governo de Eurico Gaspar Dutra, somado com a conjuntura da Guerra da Coreia, levou o Governo Vargas a montar um ministério moderado e conciliador, tendo como eixo o PSD, que terá a maioria das pastas.
Após 1953, a posição antigetulista da UDN somente se aprofundaria, especialmente na conjuntura da “Greve dos 300 mil”, ocorrida neste mesmo ano e que parou a capital paulista. Neste quadro, a “a oposição civil e militar retomou o movimento conspiratório que desembocaria na crise de agosto e no suicídio do presidente” (Costa, s/data), sobretudo liderados pelo jornalista e deputado Carlos Lacerda, através de seu jornal A Tribuna da Imprensa. Somou-se a isso a estratégia cada vez mais ousada e recorrente da tática liberal-conservadora ao instrumentalizar o discurso sobre a corrupção e sobre o suposto “mar de lama” do Governo de Vargas, juntamente com as tentativas de impeachment ou pressão para a renúncia de Vargas, mais o episódio do atentado da Rua Tonelero, no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, quando foi vitimado o major-aviador Rubens Vaz, que, em 5 de agosto de 1954, dava proteção a Carlos Lacerda. O jornalista saiu do episódio com um suspeito tiro em cima de seu pé, mas motivo suficiente para aprofundar a oposição pública contra Vargas, acuando o governo e “com a articulação rápida da oposição, por outro, envolvendo até mesmo o vice-presidente Café Filho e o ministro da Guerra, Zenóbio da Costa”, como indica Marly Motta. Como mostra a autora, no dia 12 de agosto, Nero Moura, ministro da Aeronáutica, autorizou a instauração de um Inquérito Policial Militar (IPM), trazendo as investigações do Caso Tonelero para a Base Aérea do Galeão e, “antes que o mês terminasse, um novo tiro seria ouvido: o que Vargas disparou contra o próprio peito na manhã do dia 24” (Motta, s/data).
Era a aparente vitória da "República do Galeão", da UDN e da pressão interna e externa conservadora contra Getúlio. Porém, o suicídio resultou em comoção e levante popular, fazendo com que Getúlio “saísse da vida para entrar na História”. As manifestações que se seguiram atingiram órgãos de imprensa, à direita e à esquerda do trabalhismo, ocasionando depredações de bancos e empresas que simbolizavam a oposição a Getúlio, sendo que a comoção popular com a sua morte resultou no reforço da defesa dos princípios nacionalistas e trabalhistas que o levaram a morte, tão marcados em sua Carta Testamento, especialmente junto a classe trabalhadora brasileira.
A morte de Getúlio Vargas colocará João Fernandes Campos Café Filho na Presidência da República, o qual governará por cerca de 15 meses, quando foi afastado por motivos de saúde, assumindo o presidente da Câmara, Carlos Luz. Enquanto Café Filho governou, os anseios políticos da UDN foram conquistados em parte, pois a maioria de seu ministério pertenceria a este partido.
Porém, como nos mostra Sérgio Lamarão, a movimentação política não cessou. Pelo contrário, aprofundou-se com as eleições presidenciais de outubro de 1955, quando a UDN foi novamente derrotada pela aliança que herdava o patrimônio político de Vargas, o PSD e o PTB, partidos que elegeram Juscelino Kubitschek (JK) e João Goulart, respectivamente como Presidente e Vice-Presidente da República. A reação golpista da UDN se deu com a tentativa de impedir a posse dos eleitos, com o argumento de que JK e João Goulart (Jango) não haviam obtido a maioria absoluta dos votos. A resistência legalista teve a liderança de Henrique Lott, ministro da Guerra e militar que se destacaria na defesa dos princípios constitucionais. Após outra crise política, abriu-se espaço para o TSE declarar os resultados como legítimos em 3 de outubro e empossá-los em 31 do mesmo mês (Lamarão, s/data).
Por sua vez, as adversidades políticas que marcaram o período entre a indicação de JK como candidato e sua posse na Presidência, como explica Suely Braga da Silva, “não deixavam dúvidas quanto à ferrenha oposição que teria pela frente”, capitaneados costumeiramente pela UDN. Mesmo assim, JK ousou na economia anunciando o Plano de Metas desenvolvimentista e liberal de “50 anos de progresso em 5 anos de realizações” (incluindo a construção de Brasília e a transferência da capital federal do Rio de Janeiro para o Planalto Central), marcado pela abertura ao capital estrangeiro, mesmo que contraposto a uma política de estabilidade monetária, juntamente com o respeito ao Estado Democrático de Direito (Silva, s/data).
Porém, esta perspectiva mudancista dos “Anos Dourados” não foi suficiente para evitar as tentativas de golpe contra o seu governo, incensados pela UDN e pela verve de Carlos Lacerda. No governo de JK, o Vice-Presidente Jango cumpriu papel político fundamental ao negociar com as lideranças sindicais, inclusive controlando as ações mais radicais e preservando o Presidente do desgaste, ao articular com os movimentos sociais, especialmente do campo, época em que as Ligas Camponesas tiveram crescimento significativo e, sobretudo, durante as greves de fortes categorias organizadas em nível nacional.
Nas eleições presidenciais de 1960, Jânio Quadros foi leito pelo PDC, inexpressivo em nível nacional, mas com apoio da UDN. A política ambígua de Jânio (Passagens abaixo referenciadas em Konrad y Lameira, 2011), o primeiro Presidente a tomar posse em Brasília, no que tange às relações exteriores, o colocou em uma encruzilhada, pois, ao assumir o governo, em 31 de janeiro de 1961, no mesmo dia, em rede de rádio e televisão responsabilizou JK pela situação em que encontrou o País, com uma dívida externa de 2 bilhões de dólares e inflação alta, indicando economia austera e arrocho, com fala moralizadora , o que “sempre deliciou a classe média”, mas cujas consequências são lesivas a este segmento social, bem como ao proletariado (Iglesias, 1992: 279-280).
Oito meses após iniciar seu mandato, a tática pretendida de anunciar a renúncia, para fortalecer seu poder, não obteve êxito. Sua renúncia foi aceita com facilidade. Saindo de Brasília, declarou “um dia voltarei como Getúlio”. As forças reacionárias haviam se irritado ainda mais com a política externa independente de Quadros, mas toleravam ainda menos seu vice, João Goulart. Quando Jânio Quadros renunciou, em agosto de 1961, as supostas justificativas dos ministros militares para impedir sua posse foi o fato de João Goulart promover a agitação nos meios operários, ser vinculado aos comunistas e ser simpático aos países socialistas.
Mas, a partir do Rio Grande do Sul, a Rede da Legalidade, liderada pelo Governador Leonel de Moura Brizola, ganhou a maioria do País, se opondo ao golpe promovido pelos três ministros militares de Jânio, Silvio Heck, da Marinha, Odílio Denys, do Exército e Grun Moss, da Aeronáutica, com a cumplicidade do Presidente interino Ranieri Mazzilli.
Entretanto, a vitória da Legalidade apenas adiou a sedição conservadora e udenista, o que resultou em ampliação do discurso conservador, mobilizando brasileiros para aderir à defesa do Golpe, como na construção do complexo Instituto Brasileiro de Pesquisas Sociais (IPES)/Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), articulado por setores majoritários do capitalismo atuante no Brasil, tanto em nível nacional como estrangeiro (Sobre este processo ver: Dreifuss, 1987).
O comício da Central do Brasil, em 13 de março de 1964, marcou a atitude de Goulart de aceitar o afastamento de posições mais conservadoras, se voltando para os únicos que ainda poderiam apoiá-lo: as esquerdas. A partir de então, as disputas políticas se acirraram mais ainda.
Em 1º de abril noticiava-se a deflagração do movimento golpista, com tropas partindo de Minas Gerais, sob o comando do General Mourão Filho, com apoio do Governador Magalhães Pinto. De imediato, o comandante do II Exército, Amauri Kruel aderiu. Na justificativa destes, o Golpe se dava pela preservação da liberdade e da democracia, contra a suposta conspiração comunista.
O Presidente Goulart achou que não teria condições de resistir ao Golpe com as condições militares que dispunha. Recusou-se, por sua vez, a distribuir armas à população que estava disposta a resistir, como fizera Brizola em 1961. E as 11h45min, do dia 2 de abril, voou de Porto Alegre para o exílio.
Por fim, é importante salientar, conforme demonstrou Carlos Fico (2008), o Golpe contou com total apoio e colaboração do Governo dos Estados Unidos, através do embaixador Lincoln Gordon. Tal apoio era não somente político, mas também militar consubstanciado num plano de contingência que previa apoio logístico e de tropas para os golpistas brasileiros, expresso na famosa Operação Brother Sam, que se sabe hoje, fazia parte de um plano muito mais amplo para apoiar os golpistas no Brasil.
Imediatamente após o Golpe (Passagens abaixo referenciadas em: Konrad, Lameira y Lima, 2013. Ver também: Konrad, 2013c: 162-183), centenas de pessoas foram presas (lideranças de esquerda, ministros de Goulart e opositores do Golpe) e Leonel Brizola teve de fugir e se esconder. Em nível nacional, teve inicio o período de acusações, expurgos e perseguições políticas, com destaque para o pensamento militar desenvolvido dentro da Escola Superior de Guerra (ESG), a partir de final dos anos 1940, conhecido como Doutrina de Segurança Nacional (DSN) e o combate ao “inimigo interno” (Alves, 2005: 44). O destaque dado ao inimigo interno também era fundamental para a legitimação golpista, sendo invocado constantemente para justificar a repressão e o terror do Estado.
João Goulart, Leonel Brizola, Miguel Arraes, Sereno Chaise, líderes sindicais e estudantis, trabalhadores sem terra, intelectuais, socialistas e comunistas, entre outros, pelo discurso eram corruptos, agiam seguindo os ditames do comunismo internacional, sendo responsáveis pelo caos econômico do País. O Golpe transformou-se em “revolução” no plano discursivo, responsável por defender a democracia, manter a ordem no País e combater o alto custo de vida.
Para levar adiante seu intento, a Ditadura passou a modificar a legislação eleitoral, no período compreendido entre a deposição de João Goulart (1964) e a eleição de Tancredo Neves (1985). Mais de uma dezena de atos institucionais e emendas constitucionais, leis e decretos-leis conduziram o processo eleitoral estabelecendo a ordem defendida pelo Golpe de 64 e à obtenção de uma maioria favorável ao governo. Nesse diapasão, foi alterado o tempo da duração de mandatos, cassaram-se direitos políticos, foram decretadas eleições indiretas para presidente da República, governadores dos estados e dos territórios e para prefeitos dos municípios considerados de interesse da segurança nacional e das estâncias hidrominerais, instituindo-se as candidaturas natas, o voto vinculado, as sublegendas. Somou-se a isto a alteração do cálculo para o número de deputados na Câmara, com base ora na população, ora no eleitorado, privilegiando estados politicamente incipientes, em detrimento daqueles tradicionalmente mais expressivos, reforçando assim os poderes ditatoriais do Governo pós-1964.
O primeiro Ato Institucional foi assinado pelo Conselho de Segurança Nacional, em 9 de abril de 1964. Suas principais características eram: o esvaziamento do Poder Legislativo e a respectiva valorização do Poder Executivo, mais a criação de mecanismos “legais” para a realização da “operação limpeza”. O artigo 10º tornava possível as cassações e a suspensão de direitos políticos. Por fim, o artigo 11º estipulava o prazo do ato para até 31 de janeiro de 1966, quando um novo presidente tomaria posse (Fico, 2001: 339-342).
Em decorrência do artigo 10º, dois Atos Complementares foram assinados, em 10 de abril. O primeiro suspendia direitos políticos pelo prazo de dez anos. Os principais visados eram os líderes políticos do PTB, PCB e PSB. Luiz Carlos Prestes encabeçava a lista, seguido de João Goulart, Darci Ribeiro, Leonel Brizola, Celso Furtado, Francisco Julião, Plínio de Arruda Sampaio, João Amazonas, Carlos Marighella, os quais também constavam na lista. A segunda lista cassava os mandatos de membros do Congresso Nacional. Dos 40 deputados cassados, 19 eram do PTB.
Aos poucos, os partidos eram “purificados”. Esse primeiro período de cassações não foi suficiente para garantir a submissão absoluta dos partidos políticos. Novas lideranças surgiam, visto que os cassados eram substituídos pelos seus suplentes. Além disso, políticos que inicialmente apoiaram o Golpe, diante da negativa para a realização de eleições presidenciais, voltaram-se à oposição, como Carlos Lacerda, líder da UDN, e o ex-Presidente Juscelino Kubitschek. Ao aproximarem-se as eleições de 3 de outubro de 1965, que elegeriam governadores em 11 estados, frente à perspectiva de derrota em alguns deles, o que acabou se concretizando, teve início uma nova onda de cassações.
Em 27 de outubro, foi assinado o Ato Institucional nº 2. Em seu artigo 9º, o Ato definia que a eleição presidencial se daria pelo Congresso Nacional, através de maioria simples. O artigo 18º extinguia os partidos políticos existentes. O segundo Ato foi, portanto, uma forma de garantir que a “operação limpeza” pudesse prosseguir com seu objetivo de eliminação total dos “subversivos” (Fico, 2001: 355-362). Em decorrência, em 15 de julho de 1965, foi aprovada a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei nº 4.740). Logo depois, em 27 de outubro, o AI-2 extinguiu os partidos políticos, enquanto que, ainda no mesmo ano, o Ato Complementar nº 4 determinou ao Congresso Nacional a criação de organizações com atribuições de partidos políticos, o que deu origem à Arena e ao MDB.
Como decorrência do Ato Institucional nº 2, e também do Ato Complementar nº 4, apenas dois partidos puderam se formar para completar a exigência de um mínimo de 140 congressistas. A Aliança Renovadora Nacional (ARENA) representava os interesses do governo, enquanto o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) ocupava o espaço de oposição consentida. Na prática, todas as vezes que membros do MDB tentavam alguma oposição mais veemente, tinha seus membros cassados. A oposição política poderia levar, até mesmo, ao fechamento do Congresso Nacional, como no processo de elaboração da Constituição de 1967.
Nessa conjuntura de cassações e expurgos, e sem a devolução do Governo Federal para o pleito eleitoral, como prometeram os militares golpistas numa primeira hora, em 1966, a Ditadura também passou a perseguir alguns de seus apoiadores de 1964. Em junho, Ademar de Barros foi afastado do Governo de São Paulo e cassado, ao mesmo tempo em que o MDB decidiu não apoiar a "eleição presidencial indireta", ação que colocava por terra a esperada eleição de 1966 que, segundo a esperança de alguns, devolveria o poder aos civis. Da eleição indireta, em outubro, saiu o Ditador Arthur da Costa e Silva, somando-se com a cassação dos mandatos de vários deputados federais e mais um recesso do Congresso. A resposta nacionalista, no mesmo mês, foi o lançamento da Frente Ampla, antiditadura, unindo João Goulart, Carlos Lacerda e Juscelino Kubitschek, sendo que, estes dois últimos, haviam defendido o Golpe de 1964.
Em 1967, quando foi outorgada a Constituição da Ditadura e sancionada a lei de censura da imprensa e a nova Lei de Segurança Nacional (LSN), logo jornalistas e artistas passaram a denunciar o aumento do controle e da repressão, tanto que, em novembro, a cúpula da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também apoiadora do Golpe de 1964, condenou as prisões de clérigos que se opunham à Ditadura e que se manifestavam contra a repressão. Estas manifestações foram se avolumando até o final de 1968, quando milhares de brasileiros foram às ruas, clamando “Abaixo a Ditadura!”.
Em resposta, em 13 de dezembro de1968, o AI-5, assinado por Costa e Silva, consagraria o processo de institucionalização e consolidação da Ditadura Civil-Militar. Com o AI-5, foram suspensas as garantias da Constituição de 67 e ampliados os poderes ditatoriais da Presidência da República, permitindo decretar o recesso do Congresso Nacional, o que foi feito neste mesmo momento. Alguns dos artigos reafirmavam os princípios discricionários dos atos anteriores, enquanto outros expandiam a amplitude da Ditadura, como a suspensão do habeas corpus, sendo que, apenas em 1978, com a Emenda Constitucional nº 11, o AI-5 foi revogado, quando foram modificadas as exigências para a organização dos partidos políticos. Contra o AI-5, nos anos seguintes, as ações de resistência deram-se na clandestinidade e muitas delas através da luta armada, a opção mais radical.
A Ditadura, em contraposição, ampliava seu apoio social, cuja imagem foi construída em torno das altas taxas de crescimento da economia durante o chamado “Milagre Econômico”. O golpe dentro do golpe, através do AI-5, era a senha também para o auge do Terrorismo de Estado no Brasil, simbolizada pela posse do ditador Emílio Garrastazu Médici, em 30 de outubro de 1970 (Considerações abaixo estão presentes em Konrad, 2013e: 365-378). Com Médici na linha de frente, a repressão esmagará a guerrilha urbana e iniciará o combate à Guerrilha do Araguaia, comandado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), terminando com os últimos focos de resistência apenas em 1975, já no Governo do Ditador Ernesto Geisel. Ainda em 1973, com o aprofundamento da crise do “Milagre Econômico”, aumentou a rearticulação social da Igreja Católica, através da organização das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) em oposição à Ditadura e a ação da oposição consentida, através do MDB.
Como resultado político maior da crise econômica, em 1974, ocorreu a vitória do MDB nas eleições, tendo como resposta da Ditadura a chamada “Distensão”, já no Governo do Ditador Ernesto Geisel. Porém, a distensão na acabou com a repressão no Brasil. O Ditador Geisel ainda terá no currículo de seu governo a Lei Falcão (que restringiu a propaganda eleitoral, pois os candidatos poderiam apresentar apenas uma foto pessoal, juntamente com um currículo previamente censurado), o recesso do Congresso Nacional, em Primeiro de abril de 1977, através da edição do “pacote de abril”. Com a Emenda Constitucional nº 8, o Congresso Nacional foi fechado temporariamente, enquanto seis decretos-leis alteraram as futuras eleições de 1978, quando deveriam ser renovados dois terços do Senado, porém o temor da Ditadura de se repetir o que aconteceu em 1974 fez com que uma nova regra garantisse a maioria governista no Senado, pois com o “Pacote” um terço dos senadores não foi sufragado pelo voto direto e sim referendado após uma indicação do presidente da República, os senadores biônicos, além de, também, estender o mandato presidencial de cinco para seis anos.
Nada isso impedirá a continuidade da resistência à Ditadura, mesmo que por outras formas que não a luta armada, haja vista a sua derrota histórica e final, então com a consigna da Anistia. A conjuntura destas mobilizações e os atos repressivos do ditador Ernesto Geisel estimularão a retomada dos movimentos sociais e o retorno dos mesmos às ruas. Ainda em setembro de 1977, como resultado da ampliação das mobilizações populares, a Convenção extraordinária do MDB defenderá a Constituinte Ampla e a Anistia.
Em 1978, o País presenciou o auge do movimento pela Anistia iniciado ainda em 1975. Em 2 de novembro, ocorreu o Congresso pela Anistia, em São Paulo, resultando no Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA). Rapidamente, formam-se CBAs na maioria dos estados, organizados por bairros, escolas e categorias profissionais, transformando a Luta pela Anistia em campanha nacional. Todo este processo também estimulará os operários e o movimento sindical retornar as greves, pois o arrocho salarial imposto aos trabalhadores desde 1973, bem como um período de aumento rápido da inflação, acarretará em greves econômicas e políticas.
A mudança da “distensão’ de Geisel para a “abertura” de Figueiredo, que tomará posse em 15 de março de 1979, não resultará em doações democráticas do ditador. Pelo contrário: a pressão do Comitê Brasileiro de Anistia (CBA) e das centenas de comitês pelo Brasil afora, além dos comitês de exilados, é que levará ao decreto da Anistia, em 28 de agosto.
A pressão pela volta à democracia resultará no decreto nº 6.767, de 20 de dezembro de 1979, extinguindo a Arena e o MDB e restabelecendo o pluripartidarismo, ainda que a Ditadura impeça a legalidade dos partidos comunistas, como o PCdoB e o PCB (desde a década de 1960 chamado de Partido Comunista Brasileiro). Muito menos a Ditadura de Figueiredo deixará de lado a repressão. Em 27 de agosto de 1980, uma carta-bomba explodirá na sede da OAB, no Rio de Janeiro, matando a secretária Lydia Monteiro. Desde o início daquele ano, diversas bombas explodiram no País, sobretudo atingindo bancas que vendiam jornais e revistas de oposição. Os grupos terroristas e paramilitares de direita, sem ação efetiva contra eles por parte da Ditadura, agiam abertos e/ou clandestinamente contra a redemocratização. Mas o caminho estava sendo sem volta. Em 19 de novembro de 1980, a Emenda Constitucional nº 15 restabeleceu as eleições diretas para governador e senador e eliminou a figura do senador biônico.
Em 1981, em 30 de abril, por sua vez, novamente em ação contra a abertura, integrantes do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) do I Exército explodiram acidentalmente a bomba dentro do automóvel, antes do planejado atentado para o show de música alusivo ao Primeiro de Maio, no Rio Centro, no Rio de Janeiro. A farsa da Ditadura para responsabilizar a esquerda logo se mostrou.
Depois disso, a Ditadura tratou de buscar apenas a eleição de seus candidatos, como nas eleições para governadores, em 1982. Nas eleições de 15 de novembro de 1982, a oposição, em conjunto, conquistou a maioria na Câmara dos deputados, mesmo que não tenha conseguido eleger a maioria dos governadores, excetuando-se alguns estados de oposição, como o Rio de Janeiro, que elegerá Leonel Brizola. Por outro lado, a oposição, em conjunto, obteve a maioria na Câmara dos deputados. Também em 1982, foi eliminado o voto vinculado, enquanto a Lei nº 6.996/82 dispôs sobre a utilização do processamento eletrônico de dados nos serviços eleitorais. Três anos depois, a Lei nº 7.444/85 disciplinou a implantação do processamento eletrônico de dados no alistamento eleitoral e na revisão do eleitorado, possibilitando que, em 1986, em todo o território nacional, o recadastramento atingisse quase 70 milhões de eleitores. Após a Anistia e com a volta do exílio, após o fim do bipartidarismo, Leonel Brizola e os trabalhistas visavam retomar a antiga legenda do PTB, mas uma manobra de Golbery do Couto e Silva junto ao TSE deu a legenda para o comando de Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio, não restando alternativa senão a fundação do PDT, em 26 de maio de 1980.
A Ditadura, entretanto, tratou de impedir as eleições diretas para Presidente, respondendo aos movimentos políticos iniciados em 1983. Como resposta, a Emenda das “Diretas Já”, uma das últimas vitórias da Ditadura foi a garantia no Congresso, um ano depois, em 25 de abril, das eleições indiretas.
Entretanto, o impedimento de eleições para a Presidência da República, não represou a derrota final da Ditadura. E isto é o mais significativo naquele processo histórico de resistência, iniciado ainda nos primeiros dias de 1964. Coube papel decisivo nesse processo ao protagonismo dos movimentos sociais e políticos de oposição que foram se construindo ao longo dos anos, os quais se ampliaram na fase final da Ditadura, especialmente a partir de 1979.
A derrota das “Diretas Já’, o maior movimento de massas desde o Golpe de 1964 no Brasil, foi um prenúncio que levou, em 15 de janeiro de 1985, a eleição indireta para a Presidência de Tancredo Neves e José Sarney (ex-líder do PDS, embrionário da ARENA, no Congresso e articulador do Golpe que depôs Jango) no Colégio Eleitoral, vencendo o candidato da Ditadura, Paulo Maluf, derrotado por 480 x 180 votos no Colégio Eleitoral.
No processo de abertura lenta, gradual e segura, como queriam as classes dominantes brasileiras, a eleição de Tancredo foi o possível depois da derrota da Emenda das “Diretas Já”, ainda em 1984. Mas Tancredo não chegaria a assumir a Presidência. Um dia antes de sua posse, marcada para 15 de março de 1985, foi submetido a uma cirurgia que o levará a falecer em de 21 de abril.
A partir de então, os partidos comunistas, a UNE e as centrais sindicais iriam conquistar a legalidade. Ao menos institucional e politicamente a Ditadura estava derrotada. Apesar disso tudo e da resistência intensa, através da ação e mobilização dos movimentos sociais e populares de oposição à Ditadura, a correlação de forças impediu que tais movimentos se transformassem em poder político para chegar ao Executivo do País, em 1985.
A “Nova República”, com Sarney à frente, uma “transição pelo alto”, em 15 de maio, promulgou a Emenda Constitucional nº 25, alterando os dispositivos da Constituição Federal e restabelecendo eleições diretas para presidente e vice-presidente da República, em dois turnos (o que aconteceria apenas em 1989), para deputado federal e para senador, para o Distrito Federal, para prefeito e vice-prefeito das capitais dos estados, dos municípios considerados de interesse da segurança nacional e das estâncias hidrominerais, abolindo a fidelidade partidária e revogando o artigo que previa a adoção do sistema distrital misto. Faltava ainda uma nova constituição para a Ditadura terminar no Brasil.
A autodenominada “Nova República” começaria em sobressaltos (passagens a seguir recuperam Konrad, 2013d: 196-209). Eleito indiretamente pelo Colégio Eleitoral, mesmo assim, Tancredo Neves representava a canalização dos anseios pelo retorno à democracia política do País.
Empossado como interino ainda em março, o vice-presidente eleito, José Sarney iniciou seu governo com os desafios de estabilizar a economia e terminar o processo de transição para a Nova Democracia. Afinal, mesmo oriundo do partido que sustentou a Ditadura, Sarney era o primeiro civil a governar o País desde o Golpe que derrubou Jango em 1964, sendo sustentado pela Aliança Democrática, a mesma que havia construído a vitória de Tancredo no Colégio Eleitoral, e que reunia o PMDB e o Partido da Frente Liberal (PFL), este fundado em 1985, oriundo da dissidência do PDS que rompera com a candidatura de Paulo Maluf. Em 2007, o PFL foi extinto por decisão de sua própria direção, mudando o nome da sigla para Democratas (DEM).
No Governo Sarney algumas conquistas democráticas devem ser destacadas, como a legalização dos Partidos Comunistas e da UNE, bem como a maior liberdade sindical para as centrais sindicais, especialmente a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Central Geral dos Trabalhadores (CGT), pois foram reconhecidos os direitos dos trabalhadores em se organizar além da estrutura sindical oficial (sindicatos de base, federações e confederações).
A grave crise econômica da década de 1980, oriunda da Ditadura, teve como resposta, e uma das marcas do Governo Sarney, o lançamento do Plano Cruzado, objetivando combater a inflação que vinha intensa desde o último Governo Figueiredo. Com a criação de uma nova moeda, o cruzado, e com um controverso congelamento dos preços em alta, enquanto os salários foram congelados em baixa, entretanto, o governo passou a gozar de importante apoio popular inicial. Por sua vez, a relativa estabilidade financeira fará com que o PMDB, novo Partido do Presidente, saia amplamente vitorioso das urnas nas eleições de 15 de novembro de 1986, elegendo a maioria dos governadores e parlamentares do Congresso, o que garantirá a governabilidade do Governo Sarney.
As eleições de 15 de novembro de 1986, também elegeram os futuros deputados constituintes, haja vista que a proposição de muitos movimentos sociais e políticos de oposição, por uma Constituinte Livre, Autônoma, Exclusiva e Soberana foi derrotada. Entre os eleitos em 1986, participaram na Assembleia Nacional Constituinte (ANC), entre 1987 e 1988, 594 parlamentares, sendo 559 titulares e 35 suplentes, assim representados: 512 deputados, sendo 487 eleitos no pleito de 15 de novembro de 1986 e 25 suplentes; 82 senadores, sendo 49 eleitos no pleito de 15 de novembro de 1986, 23 eleitos em 1982, além de 10 suplentes (Portal da Câmara dos Deputados. s/data).
Ulysses Guimarães (deputado federal pelo PMDB de São Paulo) foi presidente da ANC. Instalada em 1º de fevereiro de 1987, a ANC iniciou seu trabalhos no dia seguinte, encerrando os mesmos em 2 de setembro do ano seguinte. A Constituinte teve uma maioria do chamado “Centrão” (PMDB, PL, PDS, PTB e outras agremiações menores), com total apoio do Governo Sarney, representando os setores mais conservadores da política brasileira. O Art. 4° do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, por exemplo, garantiu à Sarney o mandato de seis anos. Porém, o governo de Collor-Itamar durou cinco anos, devido a Emenda Constitucional de Revisão n° 5, de 7 de junho de 1994, a qual alterou para quatro anos a duração do mandato presidencial. Como em 1994 coincidiram as eleições de presidente com as de governador, cujo mandato já era de um quatriênio, a Lei n° 8.713 (de 30 de setembro de 1993) regulou as eleições para todos os cargos. Em 1997, através da Emenda Constitucional n° 16, foi aprovada a reeleição para a Presidência da República, para governadores e para prefeitos, o que possibilitou, por exemplo, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Roussef conquistarem mandatos de oito anos (Eleições no Brasil, 2013: 75 e 78).
Este bloco majoritário, por exemplo, impediu que a questão agrária obtivesse maiores avanços, enquanto que o papel das Forças Armadas trouxe consigo o eixo autoritário da época da Ditadura. Mesmo assim, no que tange aos direitos sociais e individuais, a “Constituição Cidadã”, como Ulysses Guimarães veio a chamar a nova Carta, representou avanço rumo ao Estado de Direito que vige até hoje, o que garantiu um dos mais longos períodos democráticos da História Republicana Brasileira. Isto porque a Constituição de 1988, que terminou com a transição formal após 1985, consolidou a atual República Federativa (e Presidencialista), confirmada no plebiscito ocorrido em 21 de abril de 1993, conforme previam as Disposições Transitórias, quando o Parlamentarismo e a Monarquia foram derrotados. Além disso, a Constituição de 1988 consolidou a eleição direta para os cargos de todos os níveis, do Presidente da República ao vereador do município.
Com o fracasso do Cruzado, o Governo Sarney editaria novos planos econômicos que não evitaram a volta da inflação e o aumento da pressão popular, com novos movimentos grevistas que passaram a pressionar o Governo Sarney até o final de seu mandato.
Em 1989, uma forte campanha midiática, baseada em um discurso sobre combate à corrupção, tornava mais conhecido o então governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello, alcunhado como “caçador de marajás”. Em outra dimensão política, a ascensão dos movimentos sociais e políticos mais a esquerda, havia tornado Luiz Inácio “Lula” da Silva em um candidato em evidência para representar parte desse bloco político. Para levar adiante estes projetos, que chegariam ao segundo turno das eleições presidenciais daquele ano, a primeira desde a eleição de Jânio Quadros, em 1960, Collor liderou a organização do Partido da Reconstrução Nacional (PRN), enquanto Lula esteve a frente da formação da Frente Brasil Popular (FBP), reunindo o PT, o PCdoB e o PSB. Mais vinte candidaturas presidenciais foram lançadas, com destaque para Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS), Guilherme Afif Domingos (PL), Ulysses Guimarães (PMDB), Roberto Freire (PCB), Aureliano Chaves (PFL), Ronaldo Caiado (PSD), Afonso Camargo Neto (PTB), Enéas Carneiro (PRONA), Fernando Gabeira (PV), Celso Brant (PMN), sendo que concorreu no pleito de 15 de novembro apenas uma mulher (Lívia Maria, do Partido Nacionalista – PN), porém, a primeira candidata à Presidência na História do Brasil, demonstração dos avanços políticos pelo qual passava a Nova Democracia. No segundo turno, ocorrido em segundo em 17 de dezembro do mesmo ano, Collor venceu Lula por 35.089.998 votos (49,94%) contra 31.076.364 (44,23%) dos votos válidos, assumindo o governo em 15 de março de 1990 (parte deste processo pode ser visto em: Konrad, 1992).
O Governo de Collor seria marcado pelas medidas econômicas liberalizantes e pelas polêmicas. Decretado no segundo dia do governo e visando o controle da inflação, o “Plano Collor” estabeleceu a volta do cruzeiro como moeda e fez o confisco monetário por vinte e quatro meses, atingindo especialmente a poupança das camadas médias e as contas correntes do conjunto da população. O “Plano Collor’ seria a base de uma política liberal mais ampla, marcada por privatizações e terceirizações de empresas estatais, bem como a demissão de servidores públicos e a drástica diminuição dos investimentos sociais por parte do Estado, conhecida popularmente como neoliberalismo.
A inflação brasileira logo retomou a sua escalada, enquanto o governo Collor foi perdendo o apoio do Congresso, aprofundando a crise inflacionária, não resolvida com o “Plano Collor II”, lançado em 31 de janeiro de 1991 e sob o comando da ministra Zélia Cardoso de Mello, e os sucessivos insucessos de sua política econômica. Como resposta ao governo, poucos meses depois, em 22 de maio, aconteceu a greve geral comandada pela CUT e pela CGT, o que, dali em diante, abrirá novo período de greves de diversas categorias organizadas em nível nacional. Neste mesmo ano, em 24 de outubro, ocorreu a primeira privatização do Governo Collor, quando a USIMINAS foi entregue a iniciativa privada. Em seguida e no ano seguinte será a vez da Companhia Siderúrgica do Nordeste (COSINOR), das minas de carvão de Criciúma e Tubarão, em Santa Catarina, da COPESUL, no Rio Grande do Sul, entre outras.
No início de 1992, as manifestações contra Collor começaram a se ampliar. O Congresso da UNE tirou a consigna do “Fora Collor!”, a senha para a criação do movimento “Caras Pintadas” que mobilizaria o País, sendo que as manifestações pelo fim do governo foram aumentando gradativamente.
Com o processo no Congresso Nacional, milhares de pessoas nas ruas, como no ato de São Paulo, em 18 de setembro de 1992, reunindo 1,2 milhões de pessoas em tom de bravata, a fim de salvar seu mandato, Collor pediu em rede nacional para que os brasileiros fossem às ruas vestidos de verde e amarelo. Mas, a maioria dos que foram às ruas, vestiram preto, exigindo o impeachment. Após denúncias de corrupção feitas pelo próprio irmão do presidente, Pedro Collor de Mello, as quais teriam sido montadas pelo tesoureiro da campanha eleitoral, Paulo César Farias, a Câmara dos Deputados aprovou o impeachment de Fernando Collor, em 29 de setembro de 1991, por 411 a 38 votos
O processo de impeachment, o primeiro de nossa História, resultou na renúncia de Collor, em 29 de dezembro de 1992, após amplas acusações de corrupção e uma extensa investigação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Um dia depois, o Senado Federal, para onde Collor tinha enviado seu último recurso político, também aprovou o impeachment, tornando-se inelegível por oito anos. Depois do episódio, seu vice, Itamar Franco, que já havia deixado o PRN em 5 de maio, assumiu a Presidência da República.
O processo de impeachment de Collor, durante o Governo de Itamar Franco, resultará em um refluxo temporário das políticas liberalizantes, pois para manter a governabilidade, o governo construiu uma coalizão política que trará membros da oposição para seu Ministério. No combate à inflação, a principal medida tomada pelo governo foi a decretação de um novo plano de estabilização econômica, o “Plano Real”, resultando em uma nova moeda de mesmo nome, em julho de 1994).
Depois de assumir o Ministério da Fazenda, ainda no Governo de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso (FHC) foi lançado candidato à Presidência. Eleito em 3 de outubro de 1994, depois de enfrentar Luiz Inácio “Lula” da Silva e outros candidatos, FHC venceu no primeiro turno, obtendo 34.364.961 votos contra 17.122.127 do candidato do PT. Iniciado o novo governo, em 1º de janeiro de 1995, e com a inflação controlada, inicia-se um novo processo de privatizações no País, como a Telebrás e a Companhia Vale do Rio Doce, aprofundando-se a abertura econômica do País, cumprindo parte da promessa de acabar com a “Era Vargas” no País.
Mesmo que em sua primeira fase o “Plano Real” tenha enfrentado três grandes crises mundiais (a Crise do México em 1995, a Crise Asiática de 1997-1998 e a Crise da Rússia de 1998), o primeiro governo de FHC teve grande estabilidade econômica e base política, sobretudo contando com amplo apoio de capitais nacionais e estrangeiros e dos setores mais hegemônicos da grande imprensa, lhe proporcionando a polêmica reforma da Constituição que, em 28 de janeiro de 1997, possibilitou a emenda da reeleição (em 13 de maio, foram reveladas gravações em que dois deputados federais do Acre, Ronivon Santiago e João Maia, diziam que venderam voto a favor da emenda da reeleição por 200 mil reais), defendida por muitos como insconstitucional, além da Reforma da Previdência, aprovada em 11 de fevereiro.
Nas eleições de 4 de outubro de 1998, ainda acreditando na estabilidade do real, e alicerçado nos três grandes partidos que lhe davam sustentação política no Congresso, o PSDB, o PMDB e o PFL, FHC foi reeleito no primeiro turno, com 53% dos votos, longe dos 32% de votos alcançados pela terceira candidatura de Lula, agora tendo candidato à vice Leonel Brizola, o qual foi seguido por Ciro Gomes do Partido Popular Socialista (PPS), além de mais nove outras candidaturas.
Porém, diferente do primeiro mandato, a crise mundial do capitalismo se aprofundará e afetará quase todo o governo de FHC (no final do primeiro mandato, após a reeleição, FHC já aprovara drástica corte em investimentos sociais), provocando intensa desvalorização do real e drástico aumento de juros, a maior taxa de nossa História até então, além de intenso aumento da dívida interna.
De 2000 a 2002, o Governo FHC passará por dias que oscilavam entre as manifestações e movimentos populares e a diminuição de sua popularidade. Era a conjuntura das primeiras edições do Fórum Social Mundial, todos realizados ainda em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, quando integrantes de movimento sociais e políticos de todo o mundo se reuniam na Capital Rio-Grandense, propondo “Outro Mundo Possível”. Mesmo assim, será o primeiro governo civil eleito desde Juscelino Kubistchek que conseguirá terminar seus mandatos.
Como conseqüência do aumento da oposição ao bloco governista do PSDB-PFL, nas eleições de 6 de outubro de 2002, depois de constantes críticas à política econômica macroestrutural, defendendo o cumprimento com os compromissos do Governo de Fernando Henrique, através da “Carta aos Brasileiros”, Luiz Inácio “Lula” da Silva, em sua quarta tentativa e com uma aliança ampliada para além dos tradicionais parceiros como o PSB e o PCdoB, foi eleito Presidente do Brasil, em segundo turno, tendo como vice o empresário mineiro José Alencar. No pleito, Lula derrotou o candidato do PSDB, o senador José Serra, que fora ministro do Planejamento e da Saúde do governo anterior.
O primeiro Governo de Lula, alicerçado em ampla base de apoio nos movimentos sociais, será marcado pelo retorno da estabilidade financeira, pela ampliação dos investimentos sociais (em 30 de janeiro de 2003 foi lançado o programa Fome Zero) e transferência de renda e pelo aumento dos índices de emprego formal (de acordo com o IBGE, entre 2003 e 2006, nos quatro anos de mandato, o total de pessoas ocupadas cresceu 8,6%, enquanto o número de empregos com carteira assinada subiu 3,1%.) e do Produto Interno Bruto (PIB), contraposto pela Reforma da Previdência logo no primeiro ano de seu governo. A reforma da Previdência, que imporá os descontos de vencimentos dos aposentados do setor público, resultará nas primeiras dissidências internas do PT, gerando a expulsão de militantes históricos do Partido bem como as dissidências nos movimentos sociais, especialmente na CUT, formando a base do Partido Socialismo e Liberdade, o PSOL. Ainda no primeiro Governo Lula ocorreu a passagem ao primeiro trilhão da dívida interna, mesmo que ela tenha diminuído em proporção ao PIB, um desdobramento da manutenção da macro política econômica, mantida em relação ao governo anterior, e do superávit primário, o qual atingirá 4,5% do PIB.
Com estas políticas contraditórias, ao final do primeiro mandato, Lula tinha maior popularidade quando iniciou seu governo, em 1º de janeiro de 2003, mesmo tendo ultrapassado a crise política de 2005, a qual geraria a Ação Penal 470, ocasião em que os partidos de oposição impuseram imobilidade política a Lula e conseguir cassar mandatos de deputados da base aliada e causar a demissão de ministros importantes do governo.
Com intensa popularidade e ampla coalizão de partidos (PT, PMDB, PDT, PSB, PCdoB, PP, PR, PTB, PRB, PV, PSC e PAN, base que se ampliaria entre 2007 e 2010), Lula foi reeleito em 1º de outubro de 2006, com quase 60 milhões de votos e 60,83% dos votos, derrotando o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, em segundo turno. Logo no início de seu segundo governo, em 22 de janeiro de 2007, foi lançado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), sob a coordenação da ministra Dilma Roussef. O PAC passaria a ser a marca do segundo mandato de Lula, buscando a aceleração da economia brasileira, com investimentos em torno de meio trilhão de reais para os quatro anos seguintes. Junto ao PAC, o Governo Lula criou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), buscando nivelar a educação aos países desenvolvidos, além de levar adiante uma política externa e comercial multilateral, ampliando o reconhecimento mundial de seu governo. Tais medidas, juntamente com a expansão do crédito, a recuperação da renda de boa parte da população e o aumento do consumo interno de alimentos, alavancando setores importantes da indústria (especialmente do setor automobilístico) e da agropecuária, seriam a base para um terceiro mandato à Presidência liderado pelo PT. Ultrapassando a crise econômica mundial de 2008, que atingiu o País no final do ano, através de uma política monetária mais austera com relativo aumento da taxa de juros e desemprego, situação que não impediu Lula de terminar seu governo com mais de 70% de aprovação popular, demonstrando a estabilidade econômica e política de seu governo.
Nas eleições presidenciais de 2010, ocorreu novo marco histórico da política brasileira. Em segundo turno, em 31 de outubro do mesmo ano, foi eleita a ex-ministra das Minas e Energia e da Casa Civil do governo Lula, Dilma Roussef, a primeira mulher a ocupar a Presidência da República no Brasil. Indicada diretamente como candidata do Presidente e escolhida em convenção pelo PT, a economista mineira com trajetória na resistência armada à Ditadura Pós-1964 na VAR-Palmares (A Vanguarda Armada Revolucionária - Palmares, organizada em julho de 1969, com a unificação do Comando de Libertação Nacional - COLINA e da a Vanguarda Popular Revolucionária – VPR, e que utilizou-se da guerrilha urbana para combater a Ditadura Pós-1964, recebeu este nome em homenagem ao maior quilombo da História da Escravidão no Brasil) e ex-integrante do PDT gaúcho e ex-secretária de Minas, Energia e Comunicações do Governo Collares, em segundo turno, derrotou o candidato do PSDB, José Serra, obtendo 56,05% dos votos válidos, tendo como vice Michel Temer, militante histórico do PMDB.
A presidenta, como sempre preferiu ser chamada, apresentou ainda na propaganda eleitoral o eixo de sua plataforma, o combate à miséria com aprofundamento dos programas sociais iniciados no Governo Lula, além de uma significativa política de redução de juros. Em contrapartida, também manteve a política macro econômica de seu antecessor, avalizada por uma hegemônica base de apoio no Congresso, maior ainda que no Governo Lula, contando com o apoio de partidos que vão do PCdoB ao PP, a maioria também destas legendas também integrantes de seu diverso Ministério. Teve destaque também em seu governo, e com muita polêmica nacional, a criação em 18 de novembro de 2011, da Comissão Nacional da Verdade, visando investigar violações de direitos humanos cometidas por agentes do Estado e acontecidas no Brasil entre 1946 e 1988.
Em 2014, ainda em decorrência do prestígio político que o PT alcançou desde o Governo de Lula, Dilma Roussef foi reeleita Presidenta da República, tendo como vice o peemedebista Michel Temer, derrotando o ex-Governador de Minas Gerais e Senador Aécio Neves. Porém, desde a sua posse, e na contramão de seu projeto de governo, circunstanciada pelo agravamento da crise econômica, Dilma deu certam guinada conservadora na composição de seu ministério, especialmente na área econômica, propondo ajuste fiscal que balança sua base de apoio nos movimentos sociais e sindicais que votaram em sua reeleição, assim como passou a enfrentar diuturna oposição conservadora, seja no Congresso ou nos principais meios de comunicação das classes dominantes brasileiras, seja em movimentos de rua patrocinados pela mídia hegemônica, nos quais, setores importantes da classe média conservadora passaram a defender o impeachment da Presidenta e o “Fora Dilma”, assim como a abertura deste processo pelo presidente da Câmara dos Deputados em 02 de dezembro, o acusado de corrupção Eduardo Cunha. Assim, o Brasil chega ao ano de 2015, em um novo momento de encruzilhada histórica, em uma conjuntura de acirrada luta de classes que se expressa, essencialmente, na disputa institucional da política.
Conclusão
As contradições sociais e políticas apresentadas acima, assim, expressam as interfaces de qualquer Estado Democrático de Direito no qual os conflitos de distintas classes sociais e a luta pelo poder político da sociedade têm gerado o processo histórico que se apresenta sintetizado na disputas pelos governos durante toda a República, de 1889 até os dias atuais, seja na Primeira, na Segunda e na Terceira República, seja durante a Ditadura Civil-Militar, seja na Nova Democracia após 1985.
Ao se procurar demonstrar que as disputas políticas e eleitorais expressam a luta de classes mais genérica, temos noção que este artigo tem o limite de não aprofundar as disputas entre as frações de classe, e mesmo as disputas intraclasses, o que demandaria um esforço intelectual que fugiria dos limites deste texto.
Mesmo assim, podemos concluir que, apesar de ampliada, no Brasil, ainda a democracia é um processo em construção. Pois, como vimos, não são poucas as tentativas de golpes e os golpes vitoriosos que romperam com a sempre restrita democracia burguesa em sua formação republicana, na qual os liberais têm sido mais conservadores do que progressistas. Daí a dificuldade histórica para outro tipo e outro patamar de consolidação democrática no Brasil, uma democracia participativa, um desafio ainda em curso.
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Diorge Alceno Konrad é graduado em Licenciatura Plena em Historia pela Universidade Federal de Santa Maria (1988), mestrado em Historia do Brasil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1994) e doutorado em Historia Social do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas (2004). Atualmente é Membro da Comissão e do Conselho Editorial de "História & Luta de Classes" e do Conselho Editorial da "Crítica Marxista", Membro dos GTs Mundos do Trabalho e História e Marxismo da ANPUH-RS, Professor Associado da Universidade Federal de Santa Maria, no Departamento e no Programa de PósGraduação em História, além de Colaborador Externo do Doutorado em História da Universidade Nacional de Mar del Plata - Argentina (UNMDP). Tem experiência na área de História, com ênfase em História Social do Trabalho, atuando principalmente nos seguintes temas: História do Trabalho, Movimentos Sociais e Políticos, Rio Grande do Sul e Brasil.
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