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Pasado Abierto - Año de inicio: 2015 - Periodicidad: 2 por año
https://fh.mdp.edu.ar/revistas/index.php/pasadoabierto - ISSN 2451-6961 (en línea)

Bastos Neves

Pasado Abierto. Revista del CEHis. Nº4. Mar del Plata. Julio-Diciembre de 2016.
ISSN Nº2451-6961.
http://fh.mdp.edu.ar/revistas/index.php/pasadoabierto


A linguagem politica da Independência: Brasil, 1821-1823

Lucia M. Bastos Pereira das Neves
Universidade do Estado do Rio de Janeiro/CNPq, Brasil.
lubastos52@gmail.com

Recibido:12/10/2016
Aceptado: 6/12/2016

Resumen

Este artigo tem por objetivo analisar a linguagem política que circulou na época da Independência do Brasil e que resultara dos complexos processos em curso no mundo ocidental nesse período. Para tal, concentra-se na análise de três conceitos fundamentais da política moderna: liberdade, constituição e soberania. Estes conceitos serviram a dois tipos de liberais: de um lado, àqueles mais radicais, que acreditavam no poder da razão para organizar a nova sociedade; e, de outro, aos mais conservadores, que valorizavam a força da tradição. Como fontes, empregaram-se principalmente periódicos, panfletos impressos e papelinhos (panfletos manuscritos). Para dar suporte à abordagem política e cultural do artigo, recorreu-se à ideia das linguagens políticas de J. G. A. Pocock, retomada por Javier Fernández, mas também ao conceito de apropriação de R. Chartier.

Palavras-chave independência do Brasil; linguagens politicas; constituição; liberdade; soberania

El lenguaje político de la Independencia: Brasil, 1821-1823

Resumen

Este artículo tiene como objetivo analizar el lenguaje político que circuló en la época de la Independencia de Brasil y que resultara de complejos procesos en curso en el mundo occidental durante este período. Para tal fin, se centra en el análisis de tres conceptos fundamentales de la política moderna: libertad, constitución y soberanía. Estos conceptos sirvieron a dos tipos de liberales: por un lado a los más radicales, que creían en el poder de la razón para organizar la nueva sociedad; y por el otro, a los más conservadores, que valoraban el poder de la tradición. Como fuentes, se emplean principalmente periódicos, panfletos impresos y papelinhos (panfletos manuscritos). Para dar soporte al abordaje político y cultural del artículo, se recurre a la idea de lenguajes políticos de J. G. A. Pocock, tomada por Javier Fernández, así como también al concepto de apropiación de R. Chartier.

Palabras clave: : independencia de Brasil; lenguajes políticos; constitución; libertad; soberanía

The Political Language of the Independence: Brazil, 1821-1823

Abstract

The main objective of this article is to analyze the political language employed by those who made the Independence of Brazil, a discourse inherited from the complex processes the Western world was undergoing at the time. It concentrates in three fundamental concepts of modern politics: liberty, constitution and sovereignty. These concepts were used by two kinds of liberals: one more radical, believing in the power of reason to order a new society; the other, more conservative, valuing the force of tradition. Sources are mostly periodicals, printed and manuscript pamphlets. And to support its cultural and political approach, this paper relies on the idea of political languages proposed by J. G. A. Pocock and also employed by Javier Fernández, as well as on R. Chartier's concept of appropriation.

Keywords: independence of Brazil; political languages; constitution; liberty; sovereignty

A linguagens política da Independência: Brasil, 1821-1823

“A linguagem da razão, a voz da natureza, que fez estrondo no Douro, [...] do ocidente da Europa, soando além do Atlântico, fez eco nas abóbadas que cingem a zona ardente ao meio dia do Novo Mundo; e pela primeira vez se ouviu o doce nome de liberdade murmurar nas cristalinas águas do soberbo Amazonas [...]” (Parente, 1821: 1).

Era o ano de 1821. A ideia de Liberdade, resultante dos processos revolucionários do século XVIII, também foi transplantada e ressignificada no mundo luso-brasileiro, especialmente a partir da Revolução de 24 de agosto de 1820. Apesar do conceito não vibrar, entre os membros ilustrados das elites do Império português, com a mesma intensidade encontrada entre os homens esclarecidos do mundo europeu além Pirineus, serviu de esteio para o novo vocabulário político que permeou as principais discussões na imprensa, nos panfletos políticos, nas folhas volantes e papelinhos de 1821 a 1823, publicados tanto no Brasil, quanto em Portugal (Carvalho, Bastos & Basile, 2014 e 2013). E naquele clima febril, todo meio de expressão escrita e oral transformava-se em poderosa arma de combate, constituindo-se, muitas vezes, em uma “guerra de afrontas e calúnias” (O Campeão Portuguez, 1822: 4).

Propõe-se, assim, neste artigo, analisar as diversas linguagens políticas em que esses processos se forjaram e se confrontaram.[1] Para atingir tal objetivo, o texto propõe a análise de três conceitos fundamentais da época da política moderna: soberania, liberdade e constituição, que foram apropriados (Chartier, 2002: 13-28) por meio de valores tradicionais. Como fontes, utiliza-se a literatura de circunstância – os periódicos e panfletos impressos. Para dar suporte a esta análise, que mescla a história política e a história cultural, trabalha-se, essencialmente, com a abordagem das linguagens políticas de Pocock, pois é possível afirmar, que, em seus conceitos e linguagens, a palavra escrita abre espaço à criação de novas culturas políticas (Baker, 2006: 89-110). Afinal, textos de caráter político formulam questões e as respondem a partir de um quadro de noções e princípios que, em certa medida, aceitam, contestam ou repelem ideias e convenções predominantes num determinado momento. Portanto, registram igualmente uma historicidade (Fernández Sebástian, Javier, 2009: 25-48 e Pocock, 1971).

Deve-se destacar ainda que, apesar da publicação das duas etapas do Dicionário Iberconceptos (2007 e 2014), a novidade da proposta desse trabalho reside na análise mais aprofundada da ressignificação desses conceitos no momento restrito da Independência e de seus desdobramentos. Distingue-se, desse modo, do objetivo daquele projeto, uma vez que ele busca “desenvolver um estudo sistemático comparado da transformação dos conceitos políticos básicos nos países de língua espanhola e portuguesa de ambos os lados do Atlântico”, numa perspectiva de longa duração (aproximadamente 1750 até 1870). Procura, portanto, ensaiar “uma verdadeira história atlântica dos conceitos” (Fernández Sebastián, 2009: 25).[2]

Momento decisivo na construção de qualquer nacionalidade, a independência no Brasil foi analisada pela historiografia, durante muitas décadas, como o ponto final de um processo contínuo e linear, que, desde o século XVIII e até o XIX, forjara uma consciência nacional. Nessa ótica, em que as Cortes tinham o objetivo específico de recolonizar o Brasil, com o restabelecimento do exclusivo comercial, 1822 rompia os laços que prendiam a antiga colônia à monarquia portuguesa e punha fim às tradições coloniais.[3] Em seguida, inserida a dinâmica metrópole/colônia nos circuitos da acumulação primitiva do capital, a Independência passou a constituir o resultado da crise nos finais do século XVIII do sistema colonial dos Tempos Modernos, cujo modelo pode ser buscado na luta anti-imperialista de descolonização dos países africanos e asiáticos (Prado Junior, 1933). Na mesma linha, no início da década de 1970, outros estudos históricos interpretaram a independência como o momento inicial de um longo processo de ruptura, resultado da desagregação do sistema colonial e da montagem do Estado nacional (Novais, 1979 e Mota, 1972). Em outra perspectiva, Maria Odila Silva Dias (1972: 160-184) demonstrou que a separação política não trouxe em seu bojo qualquer ruptura, mas abriu caminho para uma reelaboração do passado colonial, que pode ser explicada em função dos interesses das elites metropolitanas e coloniais, que ganharam maior força com a vinda da Corte em 1808 e que foram destacadas por José Murilo de Carvalho (1980).

Nas últimas décadas do século XX, constatadas as permanências de longa duração da formação social brasileira, uma série de estudos, tanto no Brasil, como em Portugal, procurou inserir a independência na dinâmica mais profunda do Antigo Regime, destacando os fatores políticos e culturais que provocaram uma disputa pela hegemonia no interior do império luso-brasileiro (Silva, 1988; Alexandre, 1992; Lyra, 1994; Neves, 1995 e 2003; Berbel, 1999 e Souza, 1999). Dentro dessa ótica mais recente de trabalhos, outras preocupações afloraram –a participação das camadas populares (Kraay, 2001 e Ribeiro, 2002); a independência e a formação de identidades nacionais (Jancsó e Pimenta, 2000 e Pimenta 2002); o debate político e o estudo do vocabulário político (Oliveira, 1999; Coelho, 1993, Neves, 1999 e Lustosa, 2000); a formação de espaços de sociabilidade (Morel, 2005 e Barata, 2006)– enriquecendo a qualidade do debate sobre a independência.[4] Para além dessas questões, surgiram também estudos acerca das várias partes do Brasil, no momento do processo da emancipação política[5] , demonstrando a complexidade existente entre as diversas províncias e a Corte fluminense, como já apontou com maestria Evaldo Cabral de Mello, ao afirmar que a “fundação do Império é ainda hoje uma história contada exclusivamente do ponto do Rio de Janeiro” (2004: 11).


As diversas linguagens políticas na construção do Império do Brasil

O ano de 1821 conheceu, nos dois lados do Atlântico, a defesa das ideias liberais e constitucionais, definindo-se uma nova cultura política, que criticava os corcundas[6] , defendia o fim do Antigo Regime, os princípios do constitucionalismo monárquico, a garantia das liberdades individuais e a difusão dos princípios da Liberdade. Essa dinâmica acompanhou, por conseguinte, o ritmo do processo histórico mais amplo do mundo ocidental. Inauguravam-se práticas políticas inéditas, que chegavam a uma plateia mais ampla, estimuladas pela circulação mais intensa de escritos de circunstâncias e pela abolição, aparentemente, da censura prévia dos textos, para restringi-la às provas tipográficas (Neves, 2003: 36-48 e Algranti, 1999).

Somente, em 1822, diante das medidas intransigentes das Cortes, em particular, quando da exigência da volta do príncipe regente a Lisboa e da ordem de extinção dos órgãos administrativos estabelecidos por D. João na América, a tônica deslocou-se para a questão da emancipação do Brasil em relação a Portugal, com destaque para as polêmicas travadas entre os habitantes dos dois reinos constituintes do Império lusobrasileiro[7] (Berbel, 1999: 169-200). Doravante, contraposta à lentidão das comunicações através do oceano, a velocidade das decisões tomadas de um lado e de outro só fez aprofundar o crescente mal entendido entre as duas partes do reino. Nesse sentido, as medidas das Cortes promoveram a união das elites deste lado do Atlântico, acirrando cada vez mais o clima de animosidade contra aqueles que defendiam a proeminência de Portugal dentro do Império Português.[8] Como resultado, o constitucionalismo transformou-se em separatismo (Lima, 1989: 73)

Vários acontecimentos levavam ao caminho da separação, ainda que alguns atos do príncipe regente D. Pedro, ao longo de 1822, não pretendessem quebrar os laços de união entre Brasil e Portugal. A convocação de um Conselho de Procuradores (fevereiro), com o objetivo de estreitar os laços das províncias com o Rio de Janeiro, demonstrava a necessidade de um centro comum para aglutinar as províncias do Reino. Indicava ainda certo consenso entre as elites coimbrã[9] e brasiliense[10], embora, o instrumento indicado para realizá-lo nem sempre fosse o mesmo. Para a primeira, tratava-se de um Conselho de Procuradores Gerais, a fim de defender a causa de suas respectivas províncias (Representações, 1822: 14). Para os brasilienses, devia se organizar uma Junta a fim de aconselhar o príncipe em todos os negócios importantes, e “advogar os interesses e vantagens de suas províncias respectivas”.[11]

Ao final, a vitória coube aos coimbrãos, pois a iniciativa da redação do decreto deveu-se ao ministro José Bonifácio, que utilizava o termo Conselho, ao invés de Junta, palavra, que, à época, carregava um significado mais forte de instrumento controlador do poder executivo, sendo preferida pela elite brasiliense, como se pode verificar na carta do Senado. Dessa forma, a proposta colocada em prática resultava muito mais das ideias moderadas da elite coimbrã, afinadas com o conservadorismo monárquico de d. Pedro.[12] Ressalte-se que os partidários do Antigo Regime, como o ministro Tomás Vilanova Portugal, não mais se faziam presentes, desde sua partida com D. João VI para Portugal, em abril de 1821.

O decreto de 16 de fevereiro, porém, provocou vivo debate na imprensa da época, particularmente em torno de sua linguagem. A afirmativa do regente –“e desejando eu para utilidade geral do Reino Unido e particular do bom povo do Brasil, ir de antemão dispondo e arreigando o sistema constitucional, que ele merece e eu jurei dar-lhe”– foi amplamente questionada, uma vez que o juramento prestado no ano anterior, fora o de observar a Constituição que as Cortes fizessem e não a que o próprio d. Pedro poderia vir a dar.

Em defesa do referido decreto, o folheto assinado por um “Franco Constitucional” procurava diminuir o mal-estar causado, entre os constitucionalistas mais liberais, pela frase polêmica do soberano. Afirmava que “sem a prudência e sem a poderosa cooperação do Príncipe não se jurariam, nem tais bases, nem tal Constituição; ou nadaríamos ainda hoje no próprio sangue, que faríamos correr uns contra os outros”. Assim, o príncipe, pretendia dar a Carta, não como legislador, mas “como generoso protetor dessa Constituição”. Considerava bastante perigoso, “particularmente na época” em que se vivia, “fazer guerra às palavras e inspirar sem o querermos no povo o gosto funesto das sutilezas e sofismas da teologia política” (Resposta ao redactor, 1822: 1).

Poucos meses depois, frente à incapacidade das Cortes de Lisboa para o diálogo, Gonçalves Ledo, líder dos brasilienses, levantou em seu jornal, o Revérbero Constitucional Fluminense, a proposta da elaboração de uma Constituição: “Sim, príncipe [...]. Eleva, eleva o templo da Liberdade brasileira; forme-se nele o livro da lei, que nos deve reger [...], a Constituição Brasílica; eis os nossos votos, eis os votos de todos os bons brasileiros ...” (nº 25, 30/04/1822).

A necessidade da formação de corpo legislativo em território brasileiro, paralelo ao Congresso de Lisboa, legitimava-se através dos escritos que justificavam sua criação a fim de preservar a unidade do Brasil, ameaçada frente às rivalidades entre as províncias do norte, fieis ao soberano Congresso, e as do sul, que apoiavam a regência constitucional do Rio de Janeiro.

A imprensa arvorou-se na grande defensora da ideia da Constituinte. Desde inícios de abril de 1822, até mesmo Hipólito da Costa, redator do Correio Braziliense, em Londres, e um dos defensores da integridade do império luso-brasileiro, via a representação nacional como o “único meio de salvar” o Brasil do “perigo iminente, a que os erros das Cortes de Lisboa, sem dúvida, o conduziriam”. Acreditava que somente a ideia de Cortes poderia evitar a anarquia em seu território, promovendo uma “sólida união dos dois Reinos, se é que ela tem de continuar de algum modo”. (v. 28, abril 1822).

As novidades do Correio Braziliense, porém, só chegaram ao Novo Mundo em maio, quando foram transcritas na imprensa fluminense, demonstrando uma opinião semelhante à de seu autor.

“Concidadãos, a nossa liberdade está em perigo, nosso risco é iminente, o remédio deve ser pronto e legal. Temos o mais legítimo de todos os legítimos poderes executivos, na pessoa do nosso regente; não podemos dispensar-nos de ter o legislativo. [...]. Seja uma voz de todos e representemos ao nosso regente que queremos, porque precisamos, já, já, e já, Cortes, Cortes e Cortes” (Correio do Rio de Janeiro, n o 8, 22/04/1822).

Essas solicitações ecoaram entre os diversos componentes das elites que, em 23 de maio, ao encaminhar representação a d. Pedro pedindo a convocação de uma Assembleia Geral das províncias do Brasil, consolidavam seu espaço na esfera pública política. O documento foi elaborado por alguns membros do grupo brasiliense. Forjando um cunho popular, esses indivíduos convidavam o público, por meio de um anúncio estampado no Correio do Rio de Janeiro, a comparecer à loja da Gazeta ou à Tipografia de Silva Porto, para “ver, ler e assinar a representação a ser enviada a Sua Alteza Real” (n o 33, 18/05/1822). No documento original constam 2.982 assinaturas, embora, segundo o mesmo jornal, seis mil pessoas tenham assinado. De qualquer modo, legitimava-se a representação por meio de uma demonstração da vontade popular.[13]

Insistindo na eleição direta por meio do voto popular para os deputados, a Representação concedia à Assembleia poderes especiais para “examinar se a Constituição, que se fizesse nas Cortes Gerais de Lisboa, [era] no seu todo adaptada ao Brasil”, e estabelecer as emendas e alterações necessárias para ser “jurada no Brasil”. Portanto, a representação lhe atribuía o “exercício do poder legislativo (Falla que, 1822: 1). Evidenciava-se a intenção das elites de dotar o Brasil de uma instituição que emanasse da soberania da nação, proposta não vista com bons olhos, nem por José Bonifácio, nem pelo grupo coimbrão. D. Pedro, porém, já demonstrara desde abril aquiescência a uma convocação de Cortes no Rio de Janeiro em carta dirigida a José Bonifácio, pois essa lhe parecia “de absoluta necessidade”, e por “ser o único açude que possa conter uma corrente tão impestada [sic] e tão forte” (D. Pedro I, 1972: 327, Carta de 3 de abril de 1822).

A solicitação de uma assembleia legislativa, entretanto, não deixou de encontrar incisivos opositores. José da Silva Lisboa criticou a ideia na Reclamação do Brasil, porque “o plano [era] o mais anômalo, cerebrino e extravagante que se podia imaginar nas atuais circunstâncias, bastando para ser rejeitado e execrado o apregoar a soberania do Brasil em contraposição à soberania nacional”. A proposta servia apenas para desorientar o espírito público, pois a Constituinte nada mais era que uma “mera farsa e paródia da que perdeu a França” (Parte XIII e Parte XIV, 1822). Somente, após o decreto oficial da convocação da Assembleia brasileira, sua atitude foi de resignação, porque acreditava que d. Pedro agia “por imperiosas razões de Estado” (Memorial Parte III, 23/07/1822). As reações a essa crítica de Silva Lisboa foram imediatas. O Revérbero Constitucional Fluminense colou em dúvida a sinceridade “deste áulico” que, por fim, se declarava por um partido: declarava-se “anticonstitucional” (no 1, 28/05/1822)

A polêmica aproveitou os espaços gestados pela nova cultura política do liberalismo. Todo cidadão podia comunicar ao público seus pensamentos, como um dos mais sagrados direitos do homem, no exercício da liberdade de imprensa. Tal fato demonstrava a intervenção do indivíduo comum na construção dos destinos da coisa pública, uma vez que se disseminavam notícias e informações a uma plateia mais ampla, tirando-as do domínio privado para um espaço público, esboçando uma “voz geral” que se transformaria em autêntica opinião pública (Morel, 2005: 200-211; Neves, 2009: 1011-1023). A resposta de d. Pedro foi imediata. No próprio dia 3 de junho, por decreto, mandava convocar uma Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, composta de deputados das províncias do Brasil novamente eleitos, segundo instruções a serem fixadas. Finalmente, colocava-se com clareza o objetivo dessa assembleia: tratava-se de uma instituição não só com poderes legislativos, mas ainda com poderes de constituinte.

Era para os debates terem cessado, pois, convocada a Assembleia, ela imbuía-se de significado mais abrangente: constituía sinal aparente de que o governo do Rio de Janeiro reconhecia a soberania partilhada entre rei e nação para a autoridade política no Brasil. Outra polêmica, porém, logo agitou o meio intelectual e político. A questão do processo eleitoral, direto ou indireto, tornou-se amplamente debatida, quer através dos jornais, quer pelos folhetos políticos, quer no Conselho dos Procuradores, tanto mais que nas Cortes de Lisboa já se havia optado pelas eleições diretas desde agosto de 1821 (Diário das Cortes, 29/08/1821: 2082). Embora as duas formas de eleição preenchessem o princípio essencial do ato eleitoral, segundo a cultura política do liberalismo, pois exprimia a vontade da nação, consistiam em posições diferentes.[14] O próprio Conselho de Procuradores estava dividido quanto aos argumentos para decidir a questão.

De um lado, defendia-se a eleição direta, especialmente os brasilienses. Na Representação, entregue em 23 de maio ao príncipe regente, a grande maioria, 2.545 indivíduos, optara por eleições diretas. Logo, na visão do procurador fluminense Gonçalves Ledo, “quando o povo tem uma vez pronunciado o seu juízo, é uma necessidade do governo conformar-se com ele”. Aconselhava d. Pedro a que não se opusesse a essa “torrente impetuosa da opinião pública” (ANRJ. Cód. 2. Representação do Senado ... 20/05/1822).

Na imprensa periódica, o redator do Correio do Rio de Janeiro, defensor do método direto, pressionava por meio da velha ameaça da instalação de uma possível república, caso decidissem na direção contrária à pública opinião, pois abalava-se “o alicerce do grande edifício”, avivava-se a desconfiança das Províncias, possibilitando o surgimento de um “partido republicano, que talvez se torne invencível em pouco tempo”. Afinal, em sua visão, a tendência geral da América caminhava para a formação de uma confederação republicana (n o 35, 21/05/1822 e n o 54, 17/06/1822).

As instruções para as eleições, publicadas em 19 de junho, pelo ministro José Bonifácio, indicavam que vencera a postura do grupo mais moderado, ao se determinar a eleição indireta para a escolha dos deputados, recusando-se um modelo de monarquia constitucional mais democrático. Instalada somente, em 3 de maio de 1823, quando a independência já estava virtualmente proclamada, ainda havia províncias brasileiras contrárias à causa do Brasil, como o Maranhão, que, continuava expedindo ordens às Câmaras para executarem o juramento à Constituição portuguesa, datadas de setembro de 1822, comprovando a adesão da província ao mundo lusitano (Galves, 2015).[15]

Nas principais províncias brasileiras a notícia da convocação de uma Assembleia legislativa e constitucional alcançou a mais ampla significação. A imprensa do Rio de Janeiro decidiu comemorar o dia 3 de junho como aquele em que o Brasil acabava de “despedaçar as cadeias da escravidão”, já nada havendo a temer; estava “solenemente declarada a sua vontade” (O Papagaio, n o 6, 12 /06/1822). O Macaco brasileiro julgava aquele o “maior dia para o Brasil”, devendo ser o seu “magno aniversário, o dia natalício da sua Regeneração política”, pois “foi quando estalou o elo da corrente da dependência servil e colonial; foi quando o cancro se desarraigou do corpo gigante (n o 2, 1822). As Proclamações diversas das Câmaras das vilas, em apoio a tais acontecimentos, foram transcritas na Gazeta do Rio de Janeiro (n o 80, no 86 e no 92, 4/07, 18/07 e 1/08/1822).

Em poucas dessas manifestações de apoio à convocação a uma Assembleia brasileira, conservava-se a ideia de manutenção da integridade do Império lusobrasileiro. Afirmava-se que tal medida, longe de “separar o Brasil de Portugal”, ao contrário, era um instrumento para “consolidar a união” e “arredar a desconfiança dos brasileiros, que tanto receavam “nova escravidão” (Gazeta do Rio de Janeiro, n o 87, 20 /07/1822 e n o 88, 23/07/1822)

Os folhetos políticos, utilizando-se dos mesmos argumentos da imprensa periódica, também passaram a expressar sua opinião sobre as Cortes no Brasil.

Consideradas como o “centro político da monarquia”, transformavam-se no “lugar forte e seguro” em que a nação legitimamente representada difundiria “com igualdade as suas forças por toda a esfera política” do Brasil (Considerações, 1822: 5). Outro panfleto político congratulava-se com os brasileiros que, doravante, possuiriam uma representação semelhante às grandes nações da Europa. O Brasil igualava-se a Portugal. Não era mais possível aceitar insultos dos “pés-de-chumbo”, como o de um estudante de Coimbra que considerava este povo composto por “raças de Tupinambás e Botocudos [sic]”. Em meio a essas “tribos” levantavam-se agora homens que, ao sentarem-se no Congresso brasílico, iriam conservar “os olhos fitos nos direitos das gentes” (D. Periquito, 1822: 1).

Ainda não se pretendia a quebra dos laços de união entre Brasil e Portugal.[16] Para este último, entretanto, a notícia da convocação de uma Assembleia Brasílica trouxe questionamentos junto ao Congresso e à imprensa portuguesa, que a tomou como o selo final da separação de sua antiga colônia. Em agosto, a Gazeta de Portugal já mostrava o Brasil a caminhar para a independência, enquanto Portugal dormia (1822, no 47).

Em seguida, o Manifesto aos Povos do Brasil (1822), de Gonçalves Ledo, datado de 1º de agosto e, o Manifesto às Nações Amigas (6/08/1822), redigido por José Bonifácio, assumiam a separação como fato consumado. Se ambos culpavam o despotismo das Cortes pelo rumo dos acontecimentos, o primeiro a considerava como irreversível; o segundo, porém, continuava hesitando em descartar o projeto de um império luso-brasileiro. De todo modo, quando, em 7 de setembro, o regente proclamou o célebre Grito do Ipiranga, a Independência já estava realizada, faltando apenas oficializá-la (Lyra, 1995: 173-206; Neves, 2011: 75-113). [17]

Se, de início, houve relativa unanimidade em torno de D. Pedro, como fiador da ordem e da unidade do território, a linguagem que acabou por construir o novo Império do Brasil apresentava ambiguidades: de um lado, aqueles que desejavam maior liberdade e autonomia –o grupo mais liberal, os brasilienses; de outro, o grupo moderado das elites –os chamados coimbrãos. Não se pode afirmar que houve um acordo das elites e que os demais setores da sociedade estavam descartados do processo. Por meio da leitura dos panfletos políticos, verifica-se um entusiasmo cívico que permeava a sociedade (Carvalho, Bastos & Basille, 2014: 11-41). A proposta comum era a defesa de um Império liberal e constitucional, contudo, os projetos de construção de poder apresentavam diferenças, como é possível verificar nas duas cerimônias inaugurais do Império: a aclamação e a coroação de D. Pedro I.

Em 12 de outubro de 1822, Pedro I era aclamado Imperador do novo Império do Brasil, marcando oficialmente o rompimento entre os dois reinos, outrora irmãos. Aceitava o “título de Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil”, porque ouvira seu Conselho de Estado e de Procuradores Gerais e estava convencido de que esta era a vontade geral das províncias que se manifestavam por meio de diversas representações de apoio (Gazeta do Rio de Janeiro, n o. 124, 15/10/1822).

A proposta do ato cívico partira dos brasilienses, contando mais tarde com apoio de alguns coimbrãos. O Império do Brasil parecia nascer sob a linguagem do liberalismo, demonstrando uma relativa democratização da política[18]. O título de Imperador era oferecido ao soberano, depois de consultadas as Câmaras municipais das várias províncias. Assim, apesar de ser o único exemplo de monarquia na América Ibérica, constituía-se como um governo inspirado na soberania da nação, em que seu Defensor Perpétuo preenchia o “alto emprego de Imperador Constitucional” (Pereira, 1822: 5-6; Gazeta do Rio de Janeiro, no. 125, 17/10/1822).

Um dia depois da Aclamação, José Bonifácio de Andrada e Silva, ministro e líder dos coimbrãos, estabelecia a fórmula que devia principiar todas os atos governamentais –“D. Pedro, pela graça de Deus e unânime aclamação dos povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil”. Roubava-se aos cidadãos o direito soberano de ter aclamado seu Imperador. Voltava-se aos antigos usos, em que o monarca retirava seu poder fundamentalmente de Deus (Decreto de 13 de outubro de 1822).

Concebeu-se, então, uma segunda cerimônia inaugural para o império nascente. Em 1º de dezembro de 1822, a Coroação do imperador transcorreu em moldes quase privados, seguindo a tradição e a pompa do Antigo Regime, bem como protocolos inspirados pelo modelo napoleônico em 1804. A população conservou-se como mera espectadora. A ocasião transformou-se em “um espetáculo estranho nos fastos lusitanos e, assombroso para a América” (O Espelho, n o.109, 3/12/1822).

Após a oficialização de tais cerimônias, era preciso, no entanto, ainda construir o Império do Brasil. A montagem no Rio de Janeiro de um governo central e viável tornava-se imprescindível. Em função do clima gerado pelas ideias liberais, a opção escolhida não podia deixar de ser a de uma monarquia constitucional, mas que devia ser detalhada, sob a forma de leis, para que o novo regime obtivesse credibilidade tanto interna, quanto externamente. Nessa lógica, era a Constituição o instrumento natural para fundamentar esse processo e para cuja confecção fora convocada a Constituinte de junho de 1822.

A partir deste momento, no entanto, a confrontação entre diferentes projetos de poder passaram a explicitar-se. Alguns, como os brasilienses, acreditavam nos direitos da nação, em governo federalista e maior autonomia do poder legislativo, sem o veto do poder real. Outros, como os coimbrãos, insistiam na proposta de uma monarquia constitucional em que o poder se concentrasse, em sua essência, nas mãos do soberano. Nesse sentido, a linguagem política do liberalismo passou a ser usada de maneira diversa nas discussões da Assembleia Constituinte de 1823. Não eram partidos estruturados, mas correntes de opiniões que se agrupavam ou dividiam no desenrolar dos debates (Rodrigues, 1974). Daí, a necessidade de analisar alguns conceitos-chave para a conceituação e a performance (Pocock, 2003: 74) das linguagens desses grupos, tais como soberania, liberdade e constituição a fim de se entender a construção política do império do Brasil.


Soberania, Liberdade e Constituição.

Dessa maneira, pode-se verificar que como a linguagem do liberalismo se estruturava no Império do Brasil: de um lado, os coimbrãos, liberais e constitucionais, porém, mais moderados; de outro, os brasilienses, liberais, mais radicais e trazendo indícios de uma tradição cívica republicana, personificada, por exemplo, em Cipriano Barata, embora não tenha encontrado grande repercussão antes do fechamento da Assembleia em 1823 (Morel, 2009: 20-21).

Soberania[19], na linguagem política do liberalismo, constituía-se em um princípio fundamental de toda monarquia constitucional, que, doravante, não mais representava a autoridade pessoal e exclusiva do monarca, característica do Antigo Regime. Portanto, soberania, como conceito político, tornou-se ponto fundamental das revoluções liberais (Verdelho, 1981: 193-194). Afinal, “a soberania reside essencialmente na Nação: esta é livre e independente e não pode ser patrimônio de ninguém” (O Bem da Ordem, nº 7, 1821). Ela exerce-se e estrutura-se na Constituição política.

Esta proposição, aceita por quase todos, envolvia, contudo, posturas distintas. Alguns acreditavam que se tratava de recuperar a antiga soberania usurpada pelos abusos do poder. Entre estes, encontravam-se os que pretendiam partilhá-la com o monarca, pois, se a soberania consistia na prática do poder legislativo, não podia residir separadamente em nenhuma das partes integrantes do governo, “mas sim na reunião do monarca e deputados escolhidos pelos povos” (Gazeta do Rio de Janeiro, no . 21, 19/09/1821). Outros eram defensores de que a soberania devia residir essencialmente nos deputados, uma vez que significava “faculdade, virtude, poder, enfim, Direito exclusivo que têm os indivíduos de uma Nação coletivamente considerados de estabelecerem a forma de Governo, com quem convencionam de ser regidos” (Diário da Assembleia Geral, 29/07/1823: 477).

Não era uma questão de retórica (Carvalho, 2000: 123-152). Tratava-se de pensamentos políticos diferentes. Os primeiros, ancorados na tradição, acreditavam na retomada do passado, um campo de experiência (Koselleck, 2006: 305-327) que podia trazer uma nova proposta de liberdade, embora negassem o período de opressão já vivenciado pelo Brasil enquanto colônia, como, por exemplo, José da Silva Lisboa. Consideravam a soberania, sobretudo, um recurso de poder do soberano, uma vez que a sociedade não tinha meios de modificar o que a tradição e os costumes haviam implementado. Baseados na obra de Edmund Burke, da qual extratos foram traduzidos para o português por aquele autor em 1812 (Burke, Lisboa, 1812), também acreditavam que as reformas só podiam ser realizadas a “partir de referências ao passado”. (Burke, [1790], 1982: 66-67). Outros viam um novo horizonte de expectativa (Koselleck, 2006: 305-327), em que a Assembleia, tornava-se a legítima representante da Nação, que devia legislar para todos os cidadãos, cabendo ao soberano o papel de moderador, sem direito a veto. Linguagem próxima das ideias francesas, que encontrou eco entre a elite brasiliense. Insistiam na capacidade lógica e racional de construir a sociedade.

Essas opiniões em confronto demonstravam que, se a perspectiva de uma linguagem absolutista, em que o poder fosse exclusivo do soberano, não mais se encontrava no Império Brasílico, havia nuances distintas entre aqueles que temiam os desdobramentos de uma soberania popular, como ocorrera na França e os que postulavam a possibilidade de usar um poder voluntário, pautado na razão. Como afirmava José Joaquim Carneiro de Campos, o futuro o Marquês de Caravelas, “monarquia sem despotismo, liberdade sem anarquia” (Anais do Senado do Império, 28 de maio de 1832: 144; Lynch, 2014).

Outro conceito fundamental, Liberdade, tornou-se, na época do processo de independência do Brasil, a essência da vida do homem, em seus aspectos relativos às instituições, aos costumes, à vida individual e à vida em comum (Reflexões, 1821:2-3). Apesar de o conceito não ser desconhecido, revestiu-se de um novo significado que ultrapassava o sentido mais filosófico, comumente encontrado nos dicionários de época –a faculdade, que a alma tem de fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, como mais quer” (Silva, 1813: 221). Doravante, ligava-se à maneira de pensar resultante dos ensinamentos da Ilustração do século XVIII, em que não se admitia a liberdade absoluta, pois esta era uma quimera. Nesse caso, não havia grande distinção entre os grupos que formavam as elites. Estas não aceitavam a perspectiva de uma liberdade sem leis e sem limites. Nesse sentido, para ser respeitada e considerada como um dos principais direitos individuais do cidadão, precisava ser garantida por meio de uma Constituição e através de medidas e providências governamentais que assegurassem a estabilidade, o sossego e a união, para o “triunfo da causa da Liberdade, da razão e da justiça” (Breve exposição, 1822: 5). Em 1822, a expressão liberdade política ganhou contorno próprio, uma vez que surgiu de conformidade com direitos que o novo país devia usufruir em relação à sua antiga metrópole: “a cabala antibrasílica, mas que bem longe de conseguir o seu depravado intento, não tem feito mais que acelerar a marcha de nossa liberdade política e a glória sem par do Grande Defensor do Brasil, o senhor d. Pedro de Alcântara” (Gazeta do Rio de Janeiro, nº 142, 26/11/1822). Procurava o Brasil defender seus direitos, por meio “da civil liberdade contra as arrogantes tentativas de Portugal” (Gazeta do Rio de Janeiro, nº 115, 24/11/1822). Assim, liberdade apresentava um conceito essencialmente político, sendo utilizado para se referir ao domínio arbitrário que as Cortes portuguesas pretendiam restabelecer sobre o Brasil. Cabia ao príncipe D. Pedro “arrancar das nossas cabeças o laço da escravidão” e dar “a divisa da Independência” (Regulador Brasílico-Luso n o . 10, 25/09/1822). Entretanto, ainda não se concebia a liberdade para os escravos, cujo cativeiro perdurou até 1888. (Neves, 2003: 131).[20]

Esses novos conceitos só eram passíveis de serem apreendidos se fossem incorporados e estabelecidos por meio de uma Constituição, símbolo de todo o movimento liberal, que podia garantir a estabilidade, o sossego e a união, fazendo triunfar a causa da Liberdade e da justiça, ao regular a soberania. A Constituição era vista como a Lei fundamental de um povo, que devia ser elaborada por uma Assembleia composta dos representantes da Nação, ou seja, a Assembleia de 1823 (Neves & Neves, 2009: 337-351).

Os jornais intentavam determinar o sentido que devia ser dado ao conceito Constituição. Os redatores do Revérbero Constitucional Fluminense ofereciam uma interessante explicação do que era uma constituição. Para eles, a constituição de um povo não era uma “lei, nem um código de leis”, porque “o estabelecimento de uma lei ou de um código de leis supõe necessariamente alguma coisa anterior”. Assim, era necessário que o povo existisse e estivesse constituído, antes de se organizar; que os homens já tivessem se tornado “cidadãos por um pacto antes de se fazerem súditos pelo estabelecimento da lei”. Era necessário que uma convenção permanente e imutável assegurasse “a todos os membros do corpo político o exercício de seus direitos essenciais” (nº 4, 18 de junho de 1822). Conscientes da falta de unidade do povo brasileiro, os redatores temiam a imposição de uma lei geral que não resultasse do próprio povo. Logo, a constituição devia garantir uma lei justa, porém, flexível, capaz de impedir a supremacia do poder do monarca sobre os demais. De maneira ousada para o meio em que viviam, incluíam, portanto, alguns princípios de teor democrático.

Outros liberais mais radicais também afirmavam que a constituição era “a ata do pacto social que fazem entre si os homens, quando se ajuntam e associam para viver em reunião ou sociedade”, de modo a esclarecer as relações em que ficavam os que governam e os governados. Tais relações nada mais eram que os direitos e deveres que deviam defender e sustentar “a vida dos cidadãos, a sua liberdade e a sua propriedade” (Caneca, 2001: 559-60).

Sem dúvida, outra era a postura dos representantes da elite coimbrã, como José da Silva Lisboa, pautado nas ideias de Montesquieu e Burke. Criticando a “galomania” de se estabelecer a democracia nos Estados monárquicos e de legitimar a constituição através do “consenso do povo”, ele apresentava muito mais uma ideia de uma carta constitucional, que significava “a ata das leis fundamentais do Estado” (Roteiro Brazilico, parte XI: 1).

Dentro dessa ótica de estabelecer os poderes que governassem uma sociedade e de garantir todos os direitos e imunidades da Nação, os escritos políticos em geral procuravam ressaltar que somente a constituição podia estabelecer a “autoridade que deve formar as leis; a que se encarrega de as fazer cumprir; e a que com efeito as há de executar”. Era a doutrina da divisão dos três poderes, fundamentada em Montesquieu, que os escritos da época, tanto do grupo coimbrão, quanto do brasiliense, pregavam a fim de que os poderes legislativo e executivo fossem divididos nos verdadeiros limites de suas naturais e políticas atribuições. Nesse caso, havia uma unanimidade de opinião (Constituição explicada, 1821: 2; Diálogo instrutivo, 1821: 3), pois se acreditava que do poder legislativo nasce a força, a segurança, a prosperidade do Estado. Do poder executivo nasce o respeito e o decoro da lei, a tranquilidade, a segurança pública e individual.

Portanto, o conceito de Constituição reunia em si todos os atributos capazes de solucionar os principais problemas que conhecia o novo Império brasileiro, em sua estruturação, uma vez que a Constituição era “o código universal da sociedade, a regra infalível da justiça, o Evangelho político da Nação, o compêndio de todas as obrigações, o manual cotidiano do cidadão” (Carvalho, 1821: 18).

Os principais valores da cultura política do novo Império eram aí esboçados: uma monarquia constitucional, que continuava aliada à Igreja, colocada doravante inteiramente a seu serviço, pois ainda se fazia necessária a doutrina cristã para maior controle dos cidadãos; uma sociedade em que reinavam os homens ilustrados cujo papel consistia em orientar a opinião do povo; uma liberdade que não ultrapassasse os direitos alheios e uma igualdade restrita ao plano da lei. Era a visão de um mundo em que a secularização ainda estava incompleta, em que a ideologia não se fazia realidade (Furet & Ozouf, 1977: 488-502).

Dessa forma, no projeto de construção do Brasil após 1822, apesar da maior politização das questões e dos termos utilizados, sobressaiu uma linguagem em que se procuravam consolidar a garantia dos direitos e a divisão dos poderes. Era um “projeto de governo constitucional e representativo no qual o príncipe –e não a assembleia–figurava como o principal representante da soberania nacional”, a fim de que não houvesse “investidas do Poder Legislativo contra o Poder Executivo” (Lynch, 2014a: 49).

* * *

Nessa perspectiva, a cultura política da Independência implantou, sem dúvida, a linguagem fundamental do liberalismo, capazes de converter a Coroa em Estado, ao extrair a política dos círculos palacianos para situá-la na praça pública; ao organizar a sociedade por meio de uma Constituição; e ao estabelecer uma divisão de poderes que definia algum espaço, como as eleições, para a participação dos cidadãos, mesmo que restritos a uma elite. A autêntica vida pública, porém, não foi capaz de estender-se além desse círculo, mais intelectual e política do que social, sediada nas principais cidades e temerosa de afetar os interesses quase sempre mudos dos poderosos de todas as latitudes. Nesse sentido, as hesitações do poder, que não conseguia substituir as velhas armas da censura e da repressão pela novidade da ideologia, e a cesura fundamental da sociedade, enraizada na visão-de-mundo tradicional, que distinguia livres e escravos, inviabilizaram a condução do liberalismo e da prática da cidadania às suas últimas consequências. O horizonte de expectativa das elites brasileiras ainda se descolara muito pouco do campo de experiência que traziam.

Nesse ambiente, a linguagem presente no processo da independência, apesar de alguns dialetos distintos, pautados uns na tradição, outros na razão e tradição, revelavam-se faces de uma mesma moeda. Ao final do Primeiro Reinado, entre 1831 e 1840, os grupos políticos, regra geral, configuraram-se como as duas forças políticas que moldaram a política do Império. Algumas vezes, tendiam a uma linguagem mais moderada, aproximando-se do ideário clássico liberal, acreditando no justo meio entre o absolutismo e a democracia (Basile, 2011: 174). Em outras, os liberais tendiam a posturas mais radicais, voltadas para a defesa dos interesses das pátrias locais, defendendo uma política federalista. Tais grupos, no entanto, não deixavam de ser constitucionalistas. Assegurava-se a montagem e o funcionamento de um regime que tinha por base a capacidade de parte do povo escolher e seguir os próprios representantes (Venturi, 1971: 43). Ao mesmo tempo, conseguia-se dotar o Império dos dispositivos necessários para que o poder não degenerasse em despotismo, nem que se transformasse em democracia, até o final do oitocentos. Essa monarquia constitucional representativa foi o liberal Império do Brasil.


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-------- (1974). A assembléia constituinte de 1823. Petrópolis: Vozes

Silva, Maria Beatriz Nizza da (1988). Movimento Constitucional e separatismo no Brasil. Lisboa: Horizonte.

Souza, Iara Lis C. (1999). Pátria Coroada: o Brasil como corpo autônomo, 1780-1831. São Paulo: Unesp.

Venturi, Franco (1971). Utopia and Reform in the Enlightenment, Cambridge: Cambridge University Press.

Verdelho, Telmo dos Santos (1981). As palavras e as ideias na Revolução Liberal de 1820. Coimbra: Instituto Nacional de Investigação Científica.

Lucia M. Bastos Pereira das Neves es Professora Titular de História Moderna (2003) do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Estágio de Pós-Doutoramento realizado no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora em História pela Universidade de São Paulo (1992). Mestre em História pela Universidade Federal Fluminense (1987). Licenciado em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1974). Sócio honorário do IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (2013). Prêmio Sérgio Buarque de Holanda da Fundação Biblioteca Nacional, categoria Ensaios, para Dicionário do Brasil Joanino (organizado em conjunto com Ronaldo Vainfas), em dezembro de 2009. Pesquisadora do CNPq (1A). Cientista do Nosso Estado (2012- 2014). Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2012 a presente data). Autora dos livros O Império do Brasil (Rio de Janeiro, Nova Fronteira,1999);Corcundas e constitucionais: a cultura política da Independência, 1820-1822(Rio de Janeiro, Revan/FAPERJ, 2003) e Napoleão Bonaparte: imaginário e política em Portugal, c.1808-1810 (São Paulo, Alameda, 2008); organizadora de diversas coletâneas, entre outras, Livros e Impressos: Retratos do Setecentos e do Oitocentos (Rio de Janeiro, EdUERJ/FAPERJ, 2009), além de autora capítulos, artigos em periódicos e comunicações em congressos, no Brasil e no exterior. Projetos de Pesquisa: (1) Pronex “Dimensões e fronteiras do Estado brasileiro no século XIX”, financiado pela FAPERJ e o CNPq, sob minha coordenação e coordenação acadêmica de José Murilo de Carvalho (UFRJ); (2) Iberconceptos I, II e III, cuja direção geral cabe a Javier Fernández Sebastián (Universidad del Pais Vasco); (3) “Entre a Política e as Letras:Minerva Brasiliense e seu lugar no mundo dos impressos no Brasil do Oitocentos”, financiado pelo CNPq e FAPERJ.


[1]Para uma comparação com o processo liberal da Espanha, ver Ángel Cabrera (2014: 37:67).

[2]Minha tese de doutorado “Corcundas e Constitucionais: a cultura política da independência”, defendida na Universidade de São Paulo em 1992 e publicada posteriormente, foi o primeiro trabalho a analisar tais conceitos e seus ressignificados no processo de Independência do Brasil, além de usar fontes inéditas, como os panfletos políticos. Seguiu a linha de trabalhos de Maria Beatriz Nizza da Silva (1988), minha orientadora, que usou os panfletos enquanto fonte, embora com abordagem distinta. Mais tarde, outros trabalhos, abordando temáticas distintas, vieram à luz, preocupados com a história dos conceitos e das linguagens políticas, como Fonseca (2004), Jasmim & Feres Júnior (2006), Feres Júnior & Jasmim (2008), Araújo (2008a; 2008b), Pimenta & Araújo (2009), Pereira (2011), entre outros.

[3]O principal trabalho que defende essa abordagem é de Rodrigues (1975-1976).

[4]Outras análises sobre a historiografia da Independência, ver Jancsó (2005); Malerba (2006) e Pimenta (2007). Certamente, a aproximação do bicentenário da Independência do Brasil (2022) e seus desdobramentos acadêmicos trarão novas contribuições sobre o tema.

[5] Sobre o estudo da Independência em outras províncias ver, sobretudo, os artigos que constituíram o livro organizado por Jancsó (2005).

[6]Eram aqueles que, em visão de época, estavam a serviço do ideário do Antigo Regime, contrários às ideias constitucionais e favoráveis ao absolutismo. O vocábulo queria dizer “o mesmo que homem anticonstitucional, ou homem satélite do despotismo” (Carta de André Mamede, 1821: 5).

[7] Não se pode afirmar que há uma disputa entre brasileiros e portugueses, uma vez que a questão fundamental era a adesão ou não à causa nacional e não a rivalidade entre ser brasileiro ou ser português. Ver Ribeiro (2002) e Neves (2003) para o caso do Brasil, e Alexandre (1993: 693-711) para Portugal.

[8]Nos anos 70, a Independência foi analisada também enquanto uma oposição ao projeto de recolonização econômica das Cortes de Lisboa. Essa abordagem foi criticada nos últimos anos, demonstrando-se que a ideia de recolonização foi construída, sobretudo, ao longo do Primeiro Reinado por meio dos escritos de José da Silva Lisboa. Ver Neves (1995), Berbel (2005: 791-808), Penalves (2009).

[9]A elite coimbrã, em geral, era mais cosmopolita, com passagem pela Universidade de Coimbra (daí o nome que os caracterizava) e larga experiência da vida pública. Era formada por indivíduos com situação familiar beneficiada, tanto em termos de capital econômico quanto de capital social e cultural. Leitores de homens ligados a um liberalismo mais moderado, como Locke, Montesquieu, Constant e os ideólogos da Restauração francesa, assumiam postura de crítica em face do Antigo Regime, sem traduzir, porém, uma proposta de ordem nova por meios revolucionários. Acreditavam, portanto, em um ideal reformista de cunho pedagógico, compatível com as luzes portuguesas e que levava a uma reforma pública, pacífica, promotora da felicidade e da liberdade nacional. Deve-se destacar que era integrada por naturais da América e da Europa (Barman, 1988: 65-96; Carvalho, 1980: 51-70; Neves, 2003: 51).

[10] Os brasilienses formavam um grupo jovem, chegados à idade adulta sob a influência da Corte na América, dispondo de um horizonte de expectativa mais circunscrito à realidade do Brasil. Próximos do ambiente de uma camada média urbana, que se formara na cidade após 1808, regra geral, fizeram seus estudos no próprio Brasil, tendo a palavra impressa seu maior e, algumas vezes, único contacto com o mundo estrangeiro. Acreditavam que a soberania residia na nação. De maneira ousada para o meio em que viviam, incluíam, por conseguinte, em suas reflexões alguns princípios de teor democrático. Era também composta por naturais do Brasil e de Portugal. Ver Neves (2003: 31), Barman (1988: 65-96).

[11] Carta que o Senado da Câmara da cidade do Rio de Janeiro dirigiu a S. A. R. o príncipe Regente, representando a utilidade da criação de uma Junta de Representantes de todas as províncias do Brasil. Apud Gazeta do Rio de Janeiro, no 24, 23/02/1822.

[12] Decreto de 16 de fevereiro de 1822. Apud Gazeta do Rio de Janeiro, no 23, 21/02/1822. Carta que o Senado... Para a análise dos dois documentos ver Silva (1988: 99-100).

[13]3 Arquivo Nacional-Rio de Janeiro (doravante ANRJ). Cód. 2. Representação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, pedindo a convocação de uma Assembleia Legislativa. 20 maio 1822.

[14] Para a discussão das eleições diretas em Portugal, ver Castro (1990): 39-47. Cf. ainda Correio do Rio de Janeiro, no 33, 18/05/1822.

[15] Para a questão do Maranhão ver também Arquivo Nacional do Torre do Tombo. Ministério do Reino. Negócios do Brasil. Caixa 623, maço 500, no 99, 22/05/1823.

[16] Para uma visão distinta, que apresenta os argumentos separatistas anteriores ao ano de 1822, ver Rodrigues (1975, v. 1) e Leite (2000: 161-170).

[17]Para outra leitura do 7 de setembro, ver Kraay (2010: 52-61).

[18]O conceito é utilizado na perspectiva de Koselleck, no sentido que o início da modernidade –situada em meados do XVIII– se faz presente por meio de alguns conceitos chaves, entre estes, o de democratização (Koselleck, 2009, 96). Tal conceito implica que o vocabulário político foi incorporado por um amplo círculo de participantes ligados às camadas instruídas e não mais exclusivamente aos membros do círculo privado da Corte. Não significava, porém, a implantação de um regime democrático, mas sim de uma forma de governo que estaria associada à aprovação popular dos governos legítimos. Deve-se lembrar que povo no Brasil do início do oitocentos podia englobar indivíduos de diversos segmentos sociais e, segundo Silvestre Pinheiro Ferreira não devia ser igualado à “populaça” de Portugal. Esta categoria cabia no Brasil aos escravos e aos libertos. Ver (Ferreira, 1822, ANRJ. Independência do Brasil e Ferreira, 2009: 1228-1240).

[19]LPara análise do conceito de soberania, ver Pereira (2014: 61-64). Apesar de pontos em comum com a autora, diverge-se da perspectiva da mesma que vê o processo de independência como resultado da tentativa de recolonização por parte das Cortes em relação ao Reino brasileiro.

[20] Para o conceito de Liberdade, ver Lynch (2014b: 69-80). Nesse verbete, porém, a abordagem procede da ciência política, trabalhando mais a sincronia do que a diacronia.

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